segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Artigo de segunda #30 – DOIS MINICONTOS INÉDITOS

Publicado em 25 de março de 2024, às 15:04
Fonte: José Neres – Professor. Membro da AML, ALL, APB e da Sobrames-MA
Imagem criada com auxílio de IA

Chegamos ao 30º número destes artigos publicados às segundas-feiras neste espaço gentilmente cedido pelo professor e escritor Marcos Fábio Belo Matos. Acho que vou juntar todos os textos aqui publicados em um e-book, para facilitar a vida dos leitores.

Para comemorar os primeiros trinta textos, coloco abaixo dois contos que acabo de escrever. Boa leitura!

CONTO 1: REPLAY

(José Neres)

– Benção, pai. Vou sair.

– Deus te abençoe, meu filho! Filho, me dá um abraço.

– Agora não posso. Estou atrasado…

– Só um abraço, filho.

– Não posso, pai, tenho que pegar uma carga. Se ficar abraçando o senhor, não pago a prestação do caminhão. Tá tudo muito caro, pai.

– Então me leva contigo. Faz tempo que não passeio contigo.

– Não dá, pai. O senhor anda devagar e vai me atrasar. Deite um pouco. Assista televisão até eu voltar.

Saí.

Foi a última vez que vi meu pai com vida.

Assim que eu saí, ele se deitou e a Morte, fantasiada de sono e sonhos, deu a ele o que eu disse que não tinha tempo para dar. Um abraço bem apertado.

***

– Filho, me dá um abraço.

– Não posso, pai. Não tenho tempo. Estou atrasado para a faculdade. Hoje tem prova.

– Posso ir com você? 

– Deus me livre… que mico! Deite um pouco e assista alguma coisa na TV. Tchau.

Saiu. 

Liguei a tevê e me deitei no sofá. 

Acho que já vi esse filme antes…

CONTO 2: COM AS PRÓPRIAS MÃOS

(José Neres)

Quatro e quinze da manhã. Acordei sobressaltada. Do outro lado da cama, meu marido roncava.

Faz cinco meses que ele não me procura. Faz cinco meses que durmo acariciando a solidão.

Meu marido não satisfaz meu desejo. É preciso matá-lo. É preciso matá-lo antes do nascer do sol… não posso perder tempo.

Eu poderia contratar alguém para fazer isso. Mas seria desleal. Terei que fazer tudo com minhas próprias mãos. 

Deus me perdoe! Mas é preciso! Não aguento mais.

Deve ser algo rápido e silencioso.

Pego o travesseiro para abafar qualquer ruído que possa aparecer. 

Com minhas próprias mãos, executo a tarefa. 

Levanto-me e vejo o corpo de meu marido ali, em total silêncio. Pela primeira vez, sinto falta daqueles roncos barulhentos.

Vou para a cozinha. Preparo o café de sempre. Dois pães. Duas xícaras. Dois pedaços de queijo e um copo d’água. Coloco tudo em uma bandeja e entro no quarto e, com a voz embargada, chamo o nome dele. 

Ele abre os olhos com o sorriso doce de sempre. Toma o café, come o pão com queijo e me agradece… 

Nada digo. Por dentro, comemoro o início de uma relação verdadeiramente fraternal. Eu, ele e a solidão teremos um futuro repleto de paz. 

Amanhã cedo, antes que ele acorde, matarei novamente meu desejo… com as próprias mãos.

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