Hyana Reis é uma jornalista e escritora, natural de Imperatriz (MA).
Comunicóloga formada pela UFMA e, atualmente, trabalha com assessoria de comunicação.
Escritora, lançou seu primeiro livro em 2014, intitulado “Vidas em Pauta”. Em 2016, participou como uma das autoras da coletânea “Crônicas e contos da cidade”, publicada pela Ética Editora. Seu primeiro livro solo, “Entre Relicários”, foi lançado em 2019. Em 2022, lançou sua mais nova obra, “Amores em tempos de @”, que foi um dos livros contemplados com o prêmio literário da Academia Imperatrizense de Letras, agraciado com o segundo lugar neste certame.
É ainda idealizadora e roteirista do documentário “Atenção para este aviso”, premiado pela Lei Aldir Blanc e exibido em 2020.
Hyana Reis também é colunista do site Região Tocantina.
TROCA-TROCA
Dá uma olhada nas geladeiras de segunda mão. Encontra uma que algum dia já foi branca. Alguns enferrujados, a luz não acende, mas funciona.
– Chegaram esses dias. Tão quase novinhas, moço! – diz o atendente de trás do balcão.
Na rua o movimento de pessoas, carros, comerciantes, bicicletas, todos misturados em um caos organizado. Parece um dos cenários de um filme da Índia.
Ao fundo a dona de casa pergunta quanto está o preço do tomate. Ao lado jovens olham uma lojinha que vende discos. Examinam o LP do Belchior, um clássico. Mais na frente a idosa pede para o senhor da garrafada um remédio para curar seu netinho, que está com quebrante. Enquanto a moça olha roupas antigas no brechó.
É fácil se distrair com o tanto que há pra ver no Mercadinho de Imperatriz.
– Então moço, vai querer? – pergunta o homem da bancada. A atenção se volta para o negócio, afinal é preciso estar muito atento ao ir ao Troca-Troca.
– Eu vou ficar. Quero dar esse celular aqui de entrada.
Entrega para o negociante, que olha bem o aparelho, acende a tela e começa a mexer. Olha riscados, quebrados, avalia a rapidez do sistema, como um verdadeiro perito.
– Dá pra ficar de 40% de entrada – é o veredicto.
Pensa na esposa que espera em casa pela geladeira “nova”, já que a antiga queimou durante uma queda de energia. “Vai dá pra segurar uns tempos, enquanto compra uma nova”, pensa. Negócio feito.
Mais na frente chama o carroceiro. Com ajuda coloca a geladeira de segunda mão na carroça, pronta para ir para casa. Enquanto se afasta do troca-troca, escuta ainda outro cliente chegar e perguntar:
– Me dá quanto nessa bicicleta moço?
DOMINGO NA FEIRA
04:00 – Na cama a esposa ainda dorme o sono profundo ao lado do marido. Mas o barraqueiro já está de pé a essa hora. Arruma as mercadorias. Coisa boa pra este domingo. Toca um café rápido e parte rumo ao Bom Sucesso.
05:00 – O casal ainda dorme. Mas o barraqueiro já chegou à feira. Barraca montada. Começa a espalhar as mercadorias. O sol nasce aos poucos no horizonte.
06:00 – O despertador toca alto. A esposa levanta, e chama o marido que ainda reclama mais cinco minutos de sono. É hora de escovar os dentes, tomar um banho e passar o café. Enquanto isso começa o movimento nas apertadas ruas do Bom Sucesso, que estão repletas de barracas, mercadorias, frutas, verduras e os mais diversos tipos de produtos: sapatos, lingerie, dvds piratas, a diversidade é surpreendente. O barraqueiro já recebe seus primeiros clientes.
07:00 – Café tomado. O casal pega a bolsa e parte para a feira. O melhor horário para conseguir comprar verdura, legumes e frutas ainda frescas para o almoço de domingo. Nas ruas, já apertadas de gente, uma negociação. O barraqueiro vende para o casal que pede um desconto, afinal estamos em crise. Para não perder o cliente o barraqueiro atende.
09:00 – O casal chega em casa com a sacola repleta da feira do Bom Sucesso. Enquanto isso o barraqueiro luta contra o sol pra vender suas mercadorias.
11:00 – Hora de fazer o almoço. A esposa escolhe as mercadorias para preparar a refeição da família. Enquanto isso o barraqueiro começa a xepa: a venda das últimas mercadorias para os compradores atrasados, ou que até preferem chegar mais tarde pra encontrar a promoção de fim de feira.
12:00 – A família senta para o almoço, o marido elogia a comida da esposa. É nessa hora que o barraqueiro junta o que sobrou e conta o dinheiro conquistado em horas no sol que brilha com tanto gosto numa manhã de domingo no Bom Sucesso.
A RUA 15
Os blocos no chão, as árvores que cortam o meio da avenida e as construções antigas que datam da época em que Imperatriz ainda era uma vila. A Rua 15 de Novembro é inconfundível.
Descendo a rua uma senhora, com seu 60 anos e o terço na mão, vai ao encontro da padroeira da cidade: Santa Tereza D’ Ávila. Entra na mais antiga igreja de Imperatriz. A missa está começando, com os fiéis que se espremem nos bancos para ver o bispo celebrando o corpo e sangue de Cristo.
Ali ao lado um grupo de amigos bebe cerveja no boteco. O som do pagode tomando conta do ambiente. Quem passa pelo quarteirão ouve o batuque do pandeiro e as vozes que cantam amém.
Não muito longe dali é o reggae quem comanda. Um barzinho alternativo com cara de casa reúne jovens, adultos e velhos ao som de Bob Marley. Nem parece que bem em frente é o sertanejo quem dita a dança, numa balada-boate.
Mas na 15 o rock também é protagonista. Os solos de guitarra são ouvidos de longe do prédio que lança à rua o som de Queen, Gun’s and Roses, Pink Floyd e tanto outros ícones.
Um quarteirão depois o cenário é totalmente diferente. Um mercado com feirantes exibindo suas frutas, verduras, legumes e até um café da manhã típico de Imperatriz. O local é ponto certo pra quem saiu da noite boêmia tão bem oferecida na Rua 15.
Mas nem só de boêmia vive a avenida mais antiga da cidade. Em seus calçamentos também andam os apreciadores de livros, que vistam a Biblioteca Municipal já no fim da rua, em busca de conhecimento, ou só de uma aventura proporcionada pelas páginas já amareladas dos livros oferecidos ali.
Nos bancos e das praças os namorados trocam carinhos. Nas lanchonetes, padarias e restaurantes as famílias se reúnem. Nas portas todas admiram o movimento. Na 15 cabe todo mundo. Cabe Imperatriz inteira em uma só avenida.