Por: Marcos Fábio Belo Matos – jornalista, professor e escritor. Membro das Academias Bacabalense e Imperatrizense de Letras.
O Natal na minha casa tinha um sentido triplamente especial: era o nascimento de Jesus; era o aniversário da minha mãe e era a celebração do casamento dos meus pais. Por isso, sempre tivemos uma festa enorme. Mamãe gostava de reunir toda a sua família – mus avós, meus tios e tias, meus primos e primas. Era uma festa enorme, em geral na nossa casa ou na casa de Mãezinha (como chamávamos nossa avó).
Fazíamos todas aquelas gulodices que a noite de natal exige – aquelas que o bolso de papai e as cotas dos outros tios e tias podia bancar. Não tinha peru, nem chester, muito menos panetone, coisas de gente muito rica. Mas a mesa era preenchida com arroz com passas, frango assado no forno com farofa dentro, coxinhas e pasteizinhos fritos, refrigerante de garrafa (não havia pet nessa época), frutas, salada de maionese e macarrão (sozinho ou com salsicha).
Obrigatoriamente, trocávamos os presentes, quase sempre a partir de um “amigo invisível” que mamãe organizava e que reunia todo mundo. E era aquela coisa de cantar as qualidades da pessoa que a gente tirou. As crianças, claro, nunca sabiam fazer esses prolegômenos e já pegavam o presente e saíam em direção do seu amigo secreto, para a alegria e risadas de todos.
E, como era também aniversário da mamãe e de casamento, tinha sempre um grande bolo de aniversário, com velinha e tudo.
Mamãe preparava a casa, desde novembro. Todo ano, nós já sabíamos que, bem no comecinho de dezembro, ela ia mandar pintar paredes, arrumar um cômodo, reformar um sofá, umas cadeiras. E, depois de a casa estar apresentável, montar a árvore – que, durante muitos anos, era sempre a mesma. A árvore era o grande momento que marcava a transformação da casa para o tão esperado dia.
Era também a noite mais longa do ano, para nós crianças. Presente recebido (o do amigo secreto e, claro, o do Papai Noel), depois da ceia ficávamos até de madrugada afagando nossos brinquedos. Ali pelas duas da manhã, caindo de sono, íamos pra cama. Ou, alguns anos, o presente do Papai Noel só era entregue quando já estávamos dormindo, colocado embaixo da cama – no meu caso, da rede, que eu, por ser o caçula, só dormi de cama depois dos 10 anos. Quando o Papai Noel achava de colocar o meu presente embaixo da rede, ele tinha 99% de chance de amanhecer mijado…
Em 1999, fizemos o nosso último Natal em família, nesse formato. Em julho de 2000, mamãe morreu. E, claro, tudo meio que perdeu o sentido. Dois anos depois da morte de mamãe, morreu Mãezinha. E, desde então, eu nunca mais passei o Natal em Bacabal, a cidade da minha infância.
Mesmo o sentido da festa, para mim, mudou muito desde que ela se foi. Por muitos anos (uns 10 ou 15), eu mesmo não aguentava ouvir falar de Natal, achava uma perda de tempo toda aquela mise-en-scene que se criava. Participava apenas de corpo presente, comia meu chester ou peru, entregava e recebia meus presentes e tchau!
Aos poucos, venho recuperando o sentido que o Natal representa. Voltei a ter alegria com ele. Voltei a ter por ele um sentimento de reunião de família. Meus natais vêm se tornando mais leves. Mamãe continua muito presente nesta noite. E o menino Jesus, que ela tanto adorava, também.
4 respostas
Bela crônica, Marcos. Feliz Natal!
Feliz Natal!
Emocionante texto. E que venham novas ressignificações em nossas vidas. Feliz Natal!
Sua história se assemelha a de muitos de nós. Como você tenho lembranças dos nossos natais com cantorias, rezas, peru assado no forno de lenha, biscoito avoador e muitas outras delícias. Que tempo bom!