EDNA FONSECA DOS SANTOS VENTURA, natural de Imperatriz. Começou a trabalhar aos quinze anos de idade em um escritório contábil, depois foi bancária por dezessete anos, passando por vários cargos, até a gerência.
Ainda adolescente, publicou crônicas e poemas no jornal O Progresso e outros periódicos da cidade. Autora dos livros Madrugada de Novembro e Ondas de Luz, em 2001 foi eleita para a Academia Imperatrizense de Letras, da qual foi Vice-Presidente por dois mandatos, de 2007 a 2011 e Presidente por dois mandatos, de 2011 a 2014. Atualmente está na vice-presidência da instituição.
Coordenou seis edições do SALIMP – Salão do Livro de Imperatriz. Participou da coordenação para a implantação de três bibliotecas comunitárias na zona rural de Imperatriz em parceria do Município de Imperatriz com o Instituto Ecofuturo.
Foi Secretária Municipal de Políticas para Mulher, de 2017 a 2020. Recebeu da Câmara Municipal de Imperatriz a comenda Barão de Coroatá, por relevantes serviços prestados à cultura municipal.
Apresenta com o esposo, desde 1994, o programa “Ondas de Luz” semanalmente, aos domingos, na Rádio Terra FM.
SILÊNCIO DOS MOAIS
Meus segredos?
Os guardo bem escondidos
no silêncio da minha alma.
Sabe por quê?
Minha verdade é íntima!
Só a poesia
consegue arrancá-la
de mim.
Para não carregar pecado
coloco meu silêncio
em movimento
Traio a irmandade
comigo mesma.
Abro a janela do cárcere e
liberto um monte de segredos.
Mas…
ainda guardo o ‘silêncio dos moais’.
É lá meu refúgio de
sobrevida a mais.
DAS ROTINAS
Todos os dias ele está ali
a jogar sua rede
na solidão do rio.
É sua rotina de vida.
Ele, a canoa, a rede de pesca e
a lentidão do seu tempo.
Todos os dias abro as janelas
da casa e da alma
Saúdo o rio, a vida e
o pescador solitário.
Apressadamente cuido da casa,
do marido, do filho.
Coloco salto alto, passo batom,
saio apressada e
mergulho na velocidade
do meu tempo.
DENSO RETRATO
Sotaque estrangeiro, mas bem compreensível. Barba aparada, rosto fino de um vermelho rosado, com sinais de melanoma. Trajava short jeans, camisa polo amarela, tênis e meia branca. Trocou breves palavras com o garçom que logo lhe trouxe uma cerveja e um copo alto de borda estreita.
As mãos, de veias grossas e esverdeadas, brincavam com os próprios dedos enquanto seu olhar se distanciava pelas ruas londrinas do passado. Fez daquele momento a oportunidade de pensar e repensar a si mesmo. Ajuizava sobre as conquistas e sobre as derrotas em seus oitenta e nove anos de idade. Se perdoava pelas mulheres abandonadas e se condenava pelos sonhos abdicados.
Quando sentiu clarear a consciência, quis redirecionar o caminho, deixar os fantasmas para trás e buscar outras possibilidades e conquistas. Mas, o corpo e a mente não mais permitiam. A alma precisava descansar.
Tomou demoradamente a quarta cerveja. Levantou-se e caminhou sem pressa para o caixa. Hesitou à porta, balançou a cabeça para si mesmo, como se estivesse na frente do espelho. Colocou seu boné branco na cabeça nevada, olhou para um lado, depois para o outro e dobrou a esquina, carregando o denso retrato que plasmou de seu passado.
Jamais saberá que, sentada a uma mesa naquele mesmo restaurante, eu ouvi todas as suas confissões a si mesmo.
A PORTA, A JANELA, A VIDA
A porta da minha infância dava para uma rua larga com muitas casas de portas e janelas abertas, convidando para entrar.
A porta da infância do meu filho dá para uma escada, com poucas casas, de portas sempre fechadas, convidando a silenciar.
A janela da minha infância dava para quintais de cercas baixas, e um arco-íris colorindo o céu e a minha alma.
A janela da infância do meu filho dá para outras janelas muito altas, com frias cortinas e apenas uma nesga de horizonte lilás.
O luar da minha infância clareava o chão e iluminava a alma. Estava ao alcance dos meus olhos e da minha mão.
O luar do meu filho é solitário. Passeia de um lado ao outro do horizonte, desapercebido de qualquer olhar.
A vida na minha infância era repleta de irmãos, bonecas, fofoletes, surras, cantigas de roda. Existiam cacimba, queimada, amarelinha, manga madura, cordel e rádio a pilha.
A vida na infância do meu filho é repleta de vídeos, jogos, controle remoto, ar condicionado, piscina, sanduíche, menino maluquinho, tarefinhas, computador.
Quando unimos nossas brincadeiras em risos, abraços, esconde-esconde e pipoca, não sei avaliar qual é a alma mais cheia de infância.
2 respostas
Estilo fantástico. Um momento de reflexão ao ler essas poesias.
Em meio a tanta aridez, é saboroso ler Edna Ventura.
Seus textos nos trazem emoção e nos aquietam a alma, pelo espiritualismo vivenciado e transportado aos leitores.