Comemorei aquela bola fora, com o mesmo entusiasmo de quem estava no estádio. Ao ver o pênalti do Roberto Baggio indo parar na torcida, senti a maior alegria do alto dos meus dez anos de idade. Na TV do vizinho, do lado de fora da casa para não sujar o piso de cerâmica.
Vibrei pelo tetracampeonato mais do que pelo tênis novo que ganhei de minha irmã. Mesmo sendo aquele o primeiro e único calçado decente que eu teria nos próximos anos. Além de completar o uniforme escolar, eu precisava dele para meus chinelos de camelô deixarem de ser o principal assunto dos coleguinhas.
Leminski tinha razão. Poesia e futebol tem mesmo uma relação de inutilidade. “Querer que a poesia tenha um porquê, querer que a poesia esteja a serviço de alguma coisa, é a mesma coisa que querer, por exemplo, que um gol do Zico tenha uma razão de ser, tenha um porquê, além da alegria da multidão. ”
Para que precisamos saber que no caminho do poeta tinha uma pedra? Para nada, se no nosso caminho não houvesse pedras também. Quando o poeta expressa de forma estética o que tem no seu interior, além da alegria à multidão, ele gera identificação.
Por isso, gosto da metáfora do “atravessamento”. É de dentro para fora que nos esfacelamos por meio da escrita. Assim cuidamos de nós mesmos e dos outros.
Criamos e recriamos mundos a ponto de ressignificar nossas vivências e transformá-las em caminho de cura. E é por isso que poesia (em versos ou não), além de expressar alegria, graça e afeto, cuida de quem escreve e de quem lê.
Uma resposta
Parabéns! E obrigada por compartilhar estas preciosidades.