Liana Melo – advogada e empreendedora e coach sistêmica.
Você já ouviu falar em Economia do Cuidado? É um termo novo para mim e para muita gente, mas que designa um trabalho que existe desde sempre, e que é bem conhecido por todos.
O site do Projeto Draft, em uma série que explica as principais palavras do vocabulário dos empreendedores da nova economia, traz a seguinte definição: “Economia do Cuidado (do original, em inglês, care economy) é um termo que designa o trabalho, majoritariamente realizado por mulheres, de dedicação à sobrevivência, ao bem-estar e/ou à educação de pessoas, assim como à manutenção do meio em que estão inseridas. No âmbito doméstico, esse trabalho é invisibilizado e não remunerado. No meio profissional — terceirizado –, é mal pago.”
Agora, deixa eu explicar do meu jeito: sabe esse trabalho que socialmente é imposto às mulheres de cuidar da casa, dos filhos, do marido, dos doentes, do preparo da alimentação, das roupas e do acompanhamento da educação dos filhos? Então, é isto: são essas horas de dedicação à família. É o que sustenta toda a sociedade, e é o maior responsável pela sobrecarga mental das mulheres nos dias de hoje.
O mercado de trabalho foi relativamente aberto para nós, porém nossa demanda de “trabalho invisível” – não reconhecido e nem remunerado – continua o mesmo. Se esse trabalho, que fazemos por amor, fosse contabilizado, segundo relatório divulgado pela organização Oxfam, somaria 12,5 bilhões de horas por dia no mundo, portanto, se remunerado, movimentaria na economia mundial mais de US$ 10,8 trilhões ao ano.
Estes números impactam a trajetória pessoal, financeira e profissional de uma mulher, já que ocupar metade ou mais do seu tempo com cuidados domésticos é uma realidade para apenas 6% dos homens.
Alguns países da América do Sul já desenvolvem políticas públicas para compensar os prejuízos causados às mulheres pela má distribuição dos serviços no âmbito doméstico, como por exemplo a Argentina , que em 2021 resolveu contabilizar horas de trabalho no cuidado dos filhos como tempo de serviço para aposentadoria. Este reconhecimento do trabalho do cuidado materno é mais uma medida para “reparar desigualdades” e um avanço na igualdade de gêneros.
Agora vamos combinar estas informações com dados da nossa realidade: o Brasil é o sétimo país com o maior número de mulheres empreendedoras no mundo. E, apesar disso, apenas 4,75 % das empresas brasileiras são lideradas por mulheres e, por outro lado, quase metade dos lares brasileiros são chefiados por elas.
Segundo o IBGE, mais de 8,5 milhões de mulheres perderam seus empregos na pandemia e o número de mulheres donas do seu negócio vem caindo desde 2020 devido à necessidade de as mulheres de se dedicarem mais às tarefas domésticas.
E, de acordo com o foro econômico mundial (FMI), serão necessários 136 anos para que a igualdade entre homens e mulheres seja alcançada no mundo. E conhecendo agora a economia do cuidado, concluímos que a reparação desta desigualdade estrutural passa não só por equiparação de salários e oportunidades mas também pelo reconhecimento do trabalho invisível que as mulheres desempenham cuidando dos seus lares.
Como sou otimista por natureza, posso também destacar que o avanço na igualdade de gêneros é um paradigma que a passos lentos vem se instalando na sociedade brasileira, homens que não mais se comportam como apenas provedores ou ajudantes no trabalho de cuidar dos filhos e da casa, mas que dividem esse trabalho com as mulheres que, em contrapartida, dividem com eles a reponsabilidade de produzir provisões financeiras para o sustento do lar.
E, dando voz não só às 10 milhões representantes do empreendedorismo feminino no Brasil, mas também a 44% da força de trabalho brasileira, pois, segundo o IBGE, em 2020 esta era a proporção de mulheres que ocupavam cargos assalariados no país, é possível questionar: o que esperamos para o futuro? Esperamos que, assim como o chamado “sexo frágil” mostrou sua força conquistando seu espaço no trabalho remunerado, que “o bando de cabra macho”, que tem por aqui em solo verde-amarelo, mostre sua sensibilidade e ocupe também seu lugar na economia do cuidado.
O que se espera é que esse trabalho, invisível ou invisibilizado, passe a ser visto, reconhecido, contabilizado, e o melhor, bem remunerado, e que com isso a roda da economia gire com “amortecedores” que melhorem o mundo do trabalho independente de gêneros, já que todos eles constituem o eixo de sustentação econômica do Brasil e do mundo.
(NOTA: A Coluna “Empreendedorismo Feminino” é coordenada pela advogada, empreendedora e coach sistêmica, Liana Melo, e se propõe a trazer, mensalmente, textos de mulheres que empreendem e refletem sobre o empreendedorimo).
5 respostas
Amei o conteúdo! Se conquista é fazendo, e fazendo bem feito ou seja não por disputa mas por necessidade e por ter direito. Parabéns Liana!
Texto de grande valia para conhecimento de milhares de mulheres que incansavelmente trabalham invisíveis em seus lares!!!!
Parabéns pelas colocações.
Parabéns pelo texto, um trabalho árduo e não valorizado, precisamos de mais políticas públicas pra valorização do trabalho femenino , trabalho esse q fica na invisibilidade é que é de suma importância para o bem estar de todos.
Amei sua escrita Liana, muito rica e tranquila de ler!
Que conteúdo! Trazer a discussão esse tema a “economia do cuidado”, despertará a muitos, na descoberta de um empreendedor dentro de si. Parabéns, Liana!