A Teoria Estrutural, apresentada por Freud na obra O ego e o id, de 1923, para dar complementaridade aos preceitos da Teoria Topográfica, consiste em sua segunda tópica, na qual estabelece a concepção do aparelho psíquico como um “modelo estrutural” ou “dinâmico” organizado por três instâncias psíquicas, denominadas Id, Ego e Superego. O termo “estrutural” está para um conjunto de elementos que desempenham funções psíquicas específicas, interagindo de modo permanente e sofrendo influências recíprocas entre si. Ou seja, de acordo com Freud, a Teoria Estrutural estabelece uma divisão da mente em três instâncias funcionais (Id, Ego e Superego), de modo que torne possível compreender o funcionamento da mente humana a partir dos conflitos provocados por impulsos instintivos. Esses conflitos são alavancados por desejos e necessidades instintivos da mente em associação com fantasias e lembranças, tendo como energia oponente ou convergente as forças anti-instintivas, regidas por códigos morais e mecanismos de defesa, os quais autorregulam os comportamentos e ações do sujeito em um jogo de equilíbrio/desequilíbrio.
De acordo com os pressupostos da Psicanálise freudiana, os conflitos mentais mais recorrentes ocorrem entre as forças do Id e do Ego, podendo ocorrer também entre o Ego e o Superego, mesmo que este último seja concebido como um mediador dos conflitos mentais. O Superego é produto de uma segunda divisão do próprio Ego, cuja estrutura se encarrega das funções do trato moral e dos conflitos autopunitivos do sujeito.
Características do Id
Segundo a Teoria da “Dualidade dos Instintos”, apresentada por Freud em 1920, o Id possui dois tipos de energia: o primeiro é alimentado pela energia agressiva, oriunda dos instintos primitivos de agressividade, e o segundo, possui natureza libídica, ou seja, é alimentado pelo instinto erótico.
Portanto, de acordo com esta Teoria, o Id é concebido como um conjunto de conteúdos específicos de natureza pulsional e de ordem inconsciente, representando o polo psicobiológico da personalidade do sujeito. Esta estrutura em questão porta-se como um reservatório inconsciente de impulsos e desejos de ordem genética, cuja função volta-se para a propagação e preservação da vida. Essa categoria, retém todos os conteúdos psíquicos herdados pelo sujeito desde sua concepção, principalmente, conteúdos provenientes dos instintos originários nas ordens somáticas da mente humana.
Em correlação à estrutura topográfica da mente é possível estabelecer a correspondência entre a instância psíquica do inconsciente e o Id. Desse modo, é possível concluir que os conteúdos do Id são inconscientes e produzidos a partir das expressões psíquicas das pulsões, que, por sua vez, possuem um duplo caráter, podendo ser inatos e hereditários ou adquiridos por recalques e repressões.
Para Freud, o Id constitui um sistema que funciona como uma fonte e como um reservatório das energias psíquicas do sujeito, sendo responsável por dar animação às operações dos demais sistemas, quais sejam, Ego e Superego. Dinamicamente, o Id funciona estabelecendo interações com as sistematizações do Ego e suas relações com os elementos objetivos oriundos da realidade circundante, bem como com os elementos que introjetamos consciente ou inconscientemente, ou que são introjetados pela cultura e pelas relações sociais no Superego.
Com relação ao caráter funcional, o Id é regido pelo princípio do prazer e os desejos provenientes dele exigem gratificações e recompensas, o que induz ao Ego realizar ações em prol destas. Ou seja, todos os impulsos e energias do Ego têm origem nas funções do Id.
O Id busca sempre uma resposta imediata para os estímulos instintivos da mente humana, sem ponderar as circunstâncias da realidade e os códigos morais e culturais da sociedade. A principal função do Id, portanto, é a de funcionar como uma válvula de descarrego para as tensões biológicas e psíquicas, uma vez que é regido pelo “princípio do prazer”.
Características do Ego
As funções plenas que o Ego desempenha na mente humana são desenvolvidas ao longo de um processo gradual e sistemático de amadurecimento do sistema nervoso, a partir de contatos e relações entre capacidades psíquicas e a realidade exterior. Suas funções são, em parte, desempenhadas por atividades atribuídas ao consciente, como as percepções objetivas e os processos intelectuais de compreensão, e em parte, por atividades psíquicas ocorridas no pré-consciente e no inconsciente. O Ego é, portanto, regido pelo princípio da realidade, o qual se encarrega dos processos de ajustamentos ambientais no contexto sociocultural, bem como da mediação nos processos de solução de conflitos estabelecidos entre o sujeito e suas subjetivações e as objetivações da realidade. Assim, o Ego intermedeia os estímulos oriundos das instâncias psíquicas e do mundo exterior, lidando ainda com os estímulos do Superego, como as fantasias, memórias e todo tipo de excitação física do sujeito.
Essa articulação entre subjeção e objeção administrada pelo Ego, tem como principal função controlar as exigências das pulsões, decidindo se estas devem ou não ser satisfeitas, controlando-as por meio de mecanismos de repressão parcial ou total ou adiando-as para circunstâncias mais favoráveis.
Uma vez que o Ego tenha sua formação no homem social, opera em acordo com o princípio da realidade, e por isso é caracterizado pelo pensamento verbal, pela lógica e pela objetivação. Do ponto de vista dinâmico, o Ego sofre pressões tanto dos desejos insaciáveis produzidos no Id, quanto pela repressão severa do Superego e os estímulos da realidade exterior. Desde modo, o Ego é dinamizado por funções motoras e sensoriais que agem a partir de demandas do Id atreladas aos fatores externos à consciência do sujeito.
Em suma, o Ego funciona como um conciliador das reivindicações das instâncias com que se relaciona, quais sejam, Id, o mundo externo e o Superego. Na teoria freudiana, nós estamos divididos entre o princípio do prazer, o qual não admite limites, e o princípio de realidade, que nos controla impondo limites. Isso leva a concluir que o Ego pode ser explicado como um sistema adaptativo que se conforma às objetivações a partir do contato do Id com realidade exterior, de modo que o Ego passa a armazenar na memória todas as experiências vivenciadas pelo sujeito em diferentes contextos e sob diferentes estímulos, e com isso vai “aprendendo” a se adaptar às conveniências do mundo externo a seu próprio favor.
Para que o Ego tenha um desenvolvimento satisfatório do ponto de vista do bom desempenho de suas funções psíquicas e dos efeitos que as experiências possam afetá-lo beneficamente, é importante reforçar as boas relações objetais primitivas, ou seja, aquelas experiências vivenciadas dentro dos ciclos familiar e social capazes de levar ao sujeito em processo de formação, ainda na primeira infância, as gratificações e as frustrações em medidas adequadas ou favoráveis ao seu desenvolvimento intelectual, moral e psicológico.
Características do Superego
Segundo Freud, o Superego tem sua gênese e se desenvolve a partir do Ego durante um espaço de tempo denominado “período de latência”, que transcorre entre a primeira infância e o início da adolescência. É nesse intervalo de tempo que a personalidade moral e social do sujeito é formada, de sorte que o Superego acompanha tal formação atuando, desde sua gênese e durante os aprendizados dessa fase, como uma espécie de juiz, ou seja, um censor que tem relações de trocas intensas com o Ego.
Nesse contexto de formação, o Superego passa por um processo de interiorização das exigências e interdições parentais, de modo que a princípio tenha uma representatividade da autoridade “paterna”, responsável por moldar o desenvolvimento infantil, oscilando entre o amor dispensado pelos pais e as punições que geram as frustações e as angústias.
Em uma segunda fase do desenvolvimento do Superego, momento em que a criança passa a renunciar a satisfação edipiana, essas proibições externas, antes incompreendidas pela criança, passam a ser recebidas por um processo de internalização. Nessa fase ocorre a substituição da instância parental por meio da identificação da criança com seus pais. No entanto, Freud adverte que o Superego não é constituído nos conformes de um modelo estabelecido pelos pais, mas de acordo a constituição do Superego deles.
Do ponto de vista funcional, o Superego é responsável por censurar os impulsos do Id, proibidos pelos princípios morais impostos pela sociedade e pela cultura em que está inserido o sujeito, impedindo-o de realizar satisfatória e plenamente seus desejos e seus instintos, principalmente, no que concerne à repressão sexual.
Freud concede à formação das ideais, à auto-observação e à consciência moral as funções, por excelência, do Superego, por serem as categorias psíquicas que mantêm relação direta com os conflitos que se estabelecem entre as aspirações do sujeito e às exigências e proibições morais imputadas a ele. Por sofrer influências múltiplas dos processos formativos nos campos da educação e do controle normativo social, cabe ao Superego se encarregar da aprendizagem dos códigos culturais, sejam estes exercidos sistematicamente pelas instituições sociais, como família, igreja e escola, ou decorridos de forma assistemática das relações sociais.
Em suma, para Freud, o Superego porta-se como uma parte especializada do Ego, estando também vinculado ao Id, atuando como um controlador, um mediador entre ambos. Uma das características importantes do Superego, está relacionada ao fato de que ele só é formado de modo pleno em uma mente sadia, daí sua especificidade em lidar com padrões éticos e estéticos, sua capacidade de ponderar entre o bem e o mal, de estabelecer autoavaliações capazes de promover julgos e suscitar no sujeito sentimento de culpa e remorsos, bem como desejos de penitência ou reparação de danos, que porventura não sejam aceitos pelos códigos morais de sua cultura.
Referências
FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos. Partes I e II. 2. ed. Rio de Janeiro: Imago; 1987.
FREUD, Sigmund. O ego e o id e outros trabalhos (1923-1925). Rio de Janeiro: Imago; 1976, Vol. XIX.
FREUD, Sigmund. Obras completas. Rio de Janeiro: Imago, 1977, Vol. XIV.
GARCIA-ROZA, Luiz Alfredo. Freud e o inconsciente. 24. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.
ROUDINESCO, Elisabet; PLON, Michel. Dicionário de psicanálise. Tradução de Vera Ribeiro e Lucy Magalhães. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.