segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

Grupo de Whatsapp é “Terra Sem Lei”? (Parte 2)

Publicado em 26 de julho de 2024, às 17:08
Fonte: Cláudio Santos – Advogado, educador e comunicador.
Woman showing a WhatsApp Messenger icon. Imagem: FreePik Premium

Na parte 1 deste texto, explanamos sinteticamente sobre normas gerais para a predominância de comportamentos civilizados nos grupos de whatsapp (Netiqueta) e fizemos algumas considerações sobre as autonomias dos grupos para criarem regras específicas, de acordo com a finalidade a ser alcançada. Continuaremos a versar sobre esse instigante e intrigante ecossistema virtual, priorizando as consequências éticas e legais das interações sociais mais frequentes.

Além das regras internas de cada grupo de whatsapp, existem aquelas que são formalmente positivadas pelo Estado (são produto de processo legislativo) e das quais ninguém pode se escusar de cumprí-las alegando que as desconhece (art. 3◦ da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro –  LINDB).

Embora seja humanamente impossível conhecer toda a legislação que é publicada oficialmente todos os dias (codicismo que caracteriza nosso positivismo jurídico), hoje vivemos na era das informações, em que facilmente podemos acessar em tempo real o que nos interessa na internet.

Além disso, com ou sem previsão legal, com respeito, empatia e consideração pelos outros, provavelmente teremos um ambiente mais harmonioso e amigável. Deste modo, reitere-se que as regras de cada grupo devem estar em consonância com preceitos legais e éticos aplicáveis com razoabilidade e proporcionalidade.

É imperioso frisar que, nas comunidades virtuais, assim como em agrupamentos sociais físicos, há o entrecruzamento de interesses. E estes podem gerar situações de conflito, que devem ser evitadas e/ou resolvidas internamente ou sob o pálio da Justiça. Com isso, está claro que, por ação ou omissão, todos os integrantes do grupo podem ter algum parcela de responsabilidade, se houver algum evento danoso nesse espaço social virtual. Todos são responsáveis pelo grupo, do ponto de vista ético e, também, do ponto de vista jurídico/legal.

Aquele(a) que cria o grupo, o faz com uma intenção e um sentido. E isso deve estar consubstanciado didaticamente (de modo claro) nas regras do grupo. Para que o integrante não seja induzido a erro, bem como possa manifestar-se, entrar e sair livremente, de acordo com sua vontade. Portanto, cabe ao(s) administrador(es) eticamente orientar, monitorar e intervir sempre que algum comportamento desviante aflorar. A existência e permanência do grupo deve sempre priorizar o bem-estar daquela coletividade, independentemente das preferências pessoais e/ou profissionais de seu(s) administrador(es).

Para ilustrar a seriedade dessa temática, de acordo com o entendimento da 34a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, os administradores de grupos de whatsapp são civilmente responsáveis pelas ofensas feitas pelos membros, se não agirem para evitá-las ou coibi-las. O tribunal estabeleceu uma compensação de R$3.000,00 (três mil reais) para o administrador que não tomou medidas adequadas em relação às ofensas. Sendo assim, é crucial que os administradores monitorem o comportamento dos membros e ajam para evitar danos morais.

Em relação aos direitos e deveres, não apenas dos administradores, mas também dos demais participantes, é evidente que são aqueles que estão presentes no mundo real/físico e outros característicos da rede mundial de computadores. Com a possibilidade de reprimendas “interna corporis” (por cada grupo, pacificação interna), suspensão, exclusão e/ou judicializações em situações mais graves (pretensões de direito(s) a serem deduzidas em juízo).

Apesar de serem populares e práticos, o uso de grupos de whatsapp não isenta seus usuários de responsabilidade por suas ações, inclusive por ofensas, crimes e disseminação de conteúdo ilegal. Vários tribunais brasileiros já proferiram decisões condenando indivíduos por difamação, calúnia ou outros atos ilícitos praticados nesses grupos, consolidando uma jurisprudência relevante para o tema. Demonstrando a crescente relevância das redes sociais e das plataformas de comunicação instantânea na vida diária e que devem estar de acordo com o Direito.

Além do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), que define princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil, a Jurisprudência tem adotado alguns princípios nesses casos, tais como: a) liberdade de expressão versus direito à honra (visa equilibrar a liberdade de expressão com o direito à honra e à imagem das pessoas. Mensagens que ultrapassam os limites da liberdade de expressão e violam direitos individuais podem resultar em responsabilidade civil ou criminal); b) reponsabilidade solidária (todos os membros ativos de um grupo de whatsapp podem ser considerados responsáveis por atos ilícitos, especialmente se houver prova de que contribuíram para a disseminação de conteúdo prejudicial); c) prova de conivência (deve haver comprovação de conivência ou de participação ativa dos membros do grupo na prática do ato ilícito para que haja condenação).

Em outras palavras, existem fatores relevantes para uma possível condenação: a) intenção do usuário; b) gravidade da ofensa (contexto e impacto na vítima); c) número de participantes do grupo e d) prova dos fatos (captura de tela, conversas, registro em ata notarial).

Podemos destacar algumas ilegalidades frequentes em grupos de whatsapp: a) crimes contra a honra: a imputação de calúnia, difamação ou injúria a alguém, ainda que com um número reduzido de membros em um grupo, pode configurar crime, sujeito à pena de reclusão e multa (arts. 138, 139 e 140 do Código Penal Brasileiro); b) discurso de ódio e de preconceito: a propagação de mensagens de ódio, discriminação ou preconceito contra grupos sociais, como gênero, raça, religião, orientação sexual ou outros, também é crime punível com reclusão e multa (art. 286 do Código Penal Brasileiro); c) ameaças: enviar mensagens contendo ameaças de violência ou dano físico a alguém, mesmo que de forma velada, pode configurar crime de ameaça (art. 147 do Código Penal Brasileiro); d) assédio: a prática de assédio moral ou sexual, por meio de mensagens repetitivas e insistentes com conteúdo ofensivo ou constrangedor, pode ser tipificada como crime, dependendo da gravidade da conduta e do impacto na vítima (arts. 216-A e 216-B do Código Penal Brasileiro); e) compartilhamento de conteúdo ilegal: a divulgação de fotos, vídeos ou outros arquivos contendo pornografia infantil, material protegido por direitos autorais ou outros conteúdos ilícitos pode resultar em sanções penais e civis para o responsável pelo compartilhamento (Lei 8.069/1990, Lei 9.610/1998 e Código Civil Brasileiro) f) disponibilização de livros em formato PDF, sem autorização do(s) autor(es): há conceito de reprodução no art. 5◦, VI, e necessidade de autorização do autor do art. 29, I, ambos da Lei de Direitos Autorais (n◦9.610/98) e violação de direito autoral (art. 184 do Código Penal, com pena de detenção de 3 meses a um ano ou multa); g) disseminação de conteúdo íntimo sem consentimento: Lei nº 13.718/2018 (popularmente conhecida como Lei Rose Leonel).

A jurisprudência brasileira sobre a condenação de atos cometidos em grupos de whatsapp está em constante desenvolvimento, refletindo a complexidade e a relevância das interações virtuais na sociedade contemporânea. Os tribunais têm se esforçado para aplicar os princípios legais tradicionais às novas formas de comunicação, garantindo que direitos individuais sejam protegidos e que atos ilícitos sejam devidamente sancionados.

Pelo que foi analisado, conclui-se cabalmente que: Grupo de whatsapp não é “Terra Sem Lei”. Apesar de ser ferramenta poderosa para a comunicação, a colaboração e o apoio mútuo, seu uso requer responsabilidade individual e coletiva para evitar os riscos e aproveitar ao máximo as oportunidades que oferecem. A legislação vigente aplica-se a todas as ações realizadas por esses grupos, permitindo que os participantes sejam responsabilizados por atos ilícitos. A ideia de que esses grupos são espaços que estão fora do alcance da lei é incorreta e pode resultar em graves consequências legais. Sendo assim, é primordial que todos os participantes de grupos de whatsapp sejam responsáveis, éticos e respeitem as leis e diretrizes aplicáveis.

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