Naquela noite, carregava um enorme peso emocional. A briga, horas antes, com a mulher que amava tinha sido muito forte. O jogo de palavras, a expressão corporal de ambos naquele instante de intenso desequilíbrio quase resulta na presença da Patrulha Maria da Penha.
Felizmente um amigo comum do casal apareceu e acalmou os ânimos. Acabou a confusão, mas, ficaram marcas nos dois lados.
Érico, desnorteado, saiu cantando pneu da porta de casa. Marcas também ficaram no asfalto. Já passavam das 10 horas da noite. Milhões de pensamentos passavam naquele instante pela sua cabeça.
-Pronto! Vou me jogar com carro e tudo dentro do rio. Ela vai ficar com um sentimento de culpa pelo resto da vida– pensou o homem.
Rápido, recuou daquele sinistro pensamento. Lembrou que a vida não se resumia a ele, ou à sua mulher. Não tinha filhos mas, havia os pais, os irmãos os amigos, o trabalho. Era muita coisa em jogo para jogar tudo dentro do rio.
– Negativo! Não é assim que vou resolver essa situação. Vou encontrar outra saída- pensou Érico, sem perceber que o velocímetro do carro já assinalava 140 quilômetros por hora.
Estava decidido salvar a relação. Ia amanhecer em casa com uma bela cesta de café da manhã e um buquê de rosas. Não valia a pena continuar naquele clima já que o motivo da briga tinha sido tão banal. Daria sim, para resolver tudo quando o sangue esfriasse.
Era perto da meia noite. Érico se aproximava da cidade onde pretendia pernoitar quando, uma luz forte e incandescente, vinda do alto rompeu a escuridão da estrada se concentrando sobre o seu carro. Reduziu a velocidade. Às cegas e assustado, agindo por instinto, levou o veículo para o acostamento.
Abriu bruscamente a porta do carro, levantou as mãos para se proteger daquela luz que parecia naquele instante lhe queimar o corpo.
Correu sem direção tentando encontrar um lugar seguro. Acabou caindo e rolando numa encosta. A luz forte continuava sobre ele. Tentou gritar, pedir socorro mas, a voz não saía. O calor aumentou ainda mais com o aproximar daquela estranha luz. Perdeu os sentidos.
As últimas coisas de que se lembrou quando acordou no hospital foi de ter visto um par de olhos vermelhos e brilhantes, saídos do meio daquela luz e de uma mão imensa, e extremamente fria, tocando-lhe o meio testa.
Sentia naquele momento uma dor de cabeça como nunca na vida; percebeu que tinha quebrado a perna direita e estava com escoriações por todo corpo.
Mais do que no resto do corpo uma minúscula e, quase imperceptível marca no centro da testa, doía intensamente. Uma dor insuportável. Justamente o local onde teria sido tocado pelo dono daqueles olhos vermelhos e brilhantes.
– Você sofreu um grave acidente na BR, meu amor. Graças a Deus, você saiu com vida. Um caminhoneiro viu seu carro tombado na beira da estrada, desceu e encontrou você alguns metros adiante, desmaiado– informou a esposa de Érico.
Anos se passaram. Érico conseguiu salvar a relação com a mulher. Reviu conceitos, mudou rumos e decidiu voltar-se mais para as coisas do espírito.
Sobre a luz forte e incandescente, não teve coragem de contar para ninguém. Temia ser alvo de chacotas. Também estava confuso. Não sabia se tudo o que viu naquela noite tinha sido realmente verdade ou fruto de sua imaginação, depois daquela briga terrível com a esposa.
Até hoje, de vez quando, Érico vai ao espelho e ali constata uma marca, quase imperceptível, na testa, o local onde teria sido tocado por uma mão grande e fria depois de ter sido perseguido por um facho de luz quente e incandescente.