Júlio César, 19, é poeta, produtor cultural, redator, repórter e estudante de Jornalismo na UFMA, que reside atualmente em São Luís, no Maranhão. Em 2018 foi premiado no 47º Concurso Internacional de Redação de Cartas, da União Postal Universal (UPU). Publicou seu livro de estreia, “Quando as Baleias Choravam” (2022), pela editora Folheando, do Pará. No mesmo período, foi vencedor do último Prêmio Volts de Literatura, a maior premiação de arte e entretenimento do estado, na modalidade voto popular. Também escreve para a Fazia Poesia, portal de literatura que abrange poetas nacionais e internacionais. Neste ano, idealizou e realizou duas edições do Clube da Esquina, projeto independente que mescla sarau de poesia, apresentações musicais e venda de livros de modo acessível, gratuito e aberto à comunidade. Seu próximo livro está previsto para o segundo semestre de 2023.
ADEUS
Adeus
Adeus, minha mulher
Adeus, minha criança
Adeus, que a vida me leva e não me deixa voltar
Adeus, adeus, plantas da praia
Adeus, pedras do cais
Adeus, amigos sem nome
Adeus, minha pobreza: cão que ladra e não come
Adeus, meu primeiro amor
do tempo em que tudo me era possível
Adeus, benzinho
Adeus, Lara. Adeus, Rebecka. Adeus à Anna e Isabela
Adeus, Carlos, poeta. Adeus, Ferreira e Marighella
Adeus, janeiro e primavera
Adeus, benzinho
Adeus, meu corpo sozinho
Adeus, meu jeito menino
Adeus aos filmes pornô
Adeus, pipoca de meu avô
Meu avô que conheci já quase morto, e que me amava
sem dizer palavras
Minha avó que roubava trocado e não sabia amar,
mas chorava à noite no quarto por estar sozinha
Adeus, meu primeiro beijo
passado que olho e não vejo
Adeus, nome, nome
que é meu nome e não fala de mim
Adeus, cajuína que nunca bebi
Adeus, sorriso que nunca sorri
Adeus, carinho que nunca senti
Adeus, gosto de kiwi
Adeus, minha tortura
Adeus, minha ternura
Adeus, minha voz de rouquidão
Adeus, meu filho sem pai
Adeus, meu irmão sem irmão
Adeus, mulher sem mim
Adeus, Brumado, Inhotim
Adeus, Tereza e Tibirí
Adeus, transporte de sábado que me levava para ti
Não…
adeus, minha vida murcha e com curva
e que tem cheiro de jasmim
Adeus, palavras
Mudo no vasto da praia
olhando pedras e pessoas
e um pássaro branco que cruzava o Atlântico
rumo a uma cidade sem nome
que chamo São Luís
De que me servem as palavras?
Palavras de adeus, com que me despeço
ou palavras de amor, com que me…
Querida, será que você não entende
que palavras não bastam?
E mesmo assim as guardo
escondidas da chuva
da morte
da violência
da injustiça
da desigualdade
e principalmente de mim
Como guardo minha cidade
cheia de fome e de guerra,
te guardo, flor amarela
dentro do meu coração.
RAPTE-SE
Carla tão chocha
entre conhecidos
Não é ela
Nem parece
O vizinho morreu de choque
Escutei, achei chocante
Papo furado de futuro
guardar mares em peneiras
Sou camaleão só aos sábados
porque aos domingos choro
e tomo solzinho gostoso
com meu cachorro
Te vi e não dei bandeira
Gosto mais de mim ou de ti? Menti
Isto não é conversa. Touché!
É um ménage à trois
Acho que sou mesmo um camaleão
me pintando em você.
AS ONDAS
Sentimentos que perdi
outros que ganhei
vêm e vão
como as ondas do mar
O amor está no mar
longe,
muito longe
e me acena
para que jamais esqueça.
POEMASAKI
Queria escrever
um poema tão bonito
que mudasse o curso
da guerra
Mas tudo
o que posso fazer
é juntar
migalhas.
MORREREI
Caminho por todas as ruas
por todos os tempos
Caminho quando não acho
e quando penso em encontrar
o caminho se estende ainda mais
Acho que já chega de pensar
Mas por que chegar?
Dentro sempre existe
aquele brilho de antes
Essa parte de mim
que vai e que deixo distante
que fica e que vai adiante
é você, sou eu
Só sei dizer te amo
e quando não souber dizer
morrerei, de susto, de alegria e de espanto,
desse jeito te amo.
TERCEIRO MUNDO
Ao perdedor,
as baratas.
2 respostas
Júlio César é sem dúvida um dos escritores mais incríveis que eu já conheci, ele tem um potencial gigantesco e te faz transcender com uma escrita acertiva e mágica, me sinto muito honrada por ter lido Quando as Baleias Choravam e tenho comentários significativos a respeito de diversos poemas nele escrito que se tornaram texto que vou levar pra vida toda. É lindo olhar a magnitude que ele tem, e como ele consegue de uma forma tão única captar diversos públicos com cada texto escrito. “Como uma luz, você iluminou todo o incerto” poema II do livro, obrigada Júlio por escrever coisas que eu sinto, e só não tenho a capacidade de descrever.
Poeta de longo fôlego lírico, dando conta do que seria apenas trivial, se não fosse suas lentes poéticas ampliando situações de tristezas, alegrias e de um pondo que poderia ter sido e não foi. Grande revelação, mais um a se juntar a Salgado Maranhão, Carvalho Junior, Bioque Medito, Hagamenon de Jesus, Antonio Ailton e mais uma dúzia e meia de bons e de ótimos poetas maranhenses.