Por: Cláudio Santos – Advogado, educador e comunicador.
Por essse dias a massiva veiculação de eventos relacionados ao fenômeno violência envolvendo o ambiente educacional gerou instabilidade social. As medidas de segurança tomadas de modo reativo foram necessárias? Qual a repercussão no mundo do Direito? O que aprendemos com essa situação?
É importante frisar que estamos a falar da comunidade educacional que é composta por: escolas (direção, professores, colaboradores, terceirizados), educandos, pais/responsáveis (família), sociedade organizada e Estado. E o diálogo permanente entre todos estes atores educacionais é que irá proporcionar a integração imprescindível para o fortalecimento de parcerias de sucesso. Evidenciando-se, por oportuno, que quando cada um deles age de acordo com suas competências e responsabilidades a segurança torna-se uma realidade diária.
Antes mesmo de toda essa comoção, sempre ressaltamos que o dever de vigilância alcança todos os integrantes acima e de modo mais específico o prestador de serviço (instituição de ensino) e o Estado (que a todos nós deve proteger). Em relação àquele a possível responsabilização se dará de modo objetivo e, com isso, todo cuidado deve ser redobrado para que as relações juspedagógicas não fomentem demandas consumeristas. E em relação a este, exigir segurança é uma atitude preventiva de gestores escolares proativos.
Além disso, é fundamental ter conhecimento prévio dos principais contatos e das competências das polícias para que em alguma eventual situação de insegurança o chamado seja atendido prontamente e não haja dúvidas sobre a decisão a ser tomada. E, em regra, temos a polícia militar (atuando de modo ostensivo, no enfrentamento imediato), a polícia civil/judiciária (fazendo uso de inteligência para investigação e cumprimento de decisões judiciais) e a guarda municipal (agindo de modo complementar ao patrulhamento da militar e na defesa dos munícipes).
E para que os procedimentos escolares aconteçam de modo eficaz, pacífico e regozijante o conhecimento básico do panorama legal pátrio e das normas internas da escola (regimento e/ou regulamento interno) por parte de todos os comprometidos com a realização da Educação é imperioso para minimizar equívocos e conflitos em potencial. Nesse diapasão destacamos, também, que no contrato educacional (documento que vincula instituição e contratante) a segurança na escola é inerente à realização de seu objeto e até mesmo no contrato pedagógico (realizado entre os docentes e os discentes) ela deve ser observada para o bom andamento da rotina escolar.
Relembrando que alguns colégios já adotaram o programa “Direito na Escola” que também versa sobre aspectos pedagógicos da segurança no ambiente escolar a partir de boas práticas de Direito, estabelecendo e estimulando o uso humanizado dos direitos e deveres no dia a dia do processo de ensino e aprendizagem.
Temos acompanhado o “nascimento” de variados protocolos de segurança em formato de cartilhas, notas ou recomendações emanados de entes públicos (federal, estadual e municipal), de sindicatos e até mesmo de instituições de ensino. E existe um movimento crescente de criação de comitês e/ou grupos de trabalho, de caráter técnico, compostos por profissionais de diversas áreas, analisando violências sob diferentes enfoques. Na tentativa de confecção de um roteiro geral consolidado de segurança dentro dos muros das escolas e no seu entorno.
A maioria, senão a totalidade das escolas públicas ou privadas, fez alterações e/ou atualizações em suas medidas de segurança em tempo recorde, pressionadas pela opinião pública e pelas famílias dos estudantes. Adquiriram novos equipamentos, reavaliaram procedimentos escolares e passaram por treinamento para momentos de crise.
Prevenir violências na Educação é uma obrigação. Porém agir de modo impulsivo, desconsiderando o bom senso e deixando-se levar pela “indústria da desinformação” e pela espetacularização midiática da violência, não condiz com uma boa gestão educacional. Porque desconsidera que o ambiente escolar é um local de paz, de produção e compartilhamento de conhecimentos e experiências e em que as decisões devem ser tomadas racionalmente, respeitando as peculiaridades da escola, o perfil dos estudantes e familiares e o contexto social circundante. Em outras palavras, ceder a pressões externas sem fundamento, a “fake news” e propagar o medo, fragiliza a já tão árdua construção pedagógica e jurídica nas escolas.
Nessa “corrida” para tornar as escolas mais seguras alguns questionamentos de ordem legal foram surgindo, dentre eles. É legal contratar segurança armada? O uso de detectores de metal é permitido? Posso impedir ou disciplinar rigidamente o acesso à escola de pais, terceirizados ou novos clientes? O material escolar do estudante pode ser revistado havendo somente a permissão do responsável legal?
Não há proibição legal para que escolas contratem segurança patrimonial armada. Contudo o uso de armas é totalmente incompatível com a atividade educacional. Contraria o diálogo e a mediação para resolver conflitos, a renúncia a atitudes e ações violentas e o respeito à diversidade dos modos de pensar e agir socialmente.
Também não há óbice legal para a verificação de segurança feita com o uso de detectores de metal, contanto que a prática não crie obstáculos e constrangimentos para o acesso à escola. Recomenda-se que isso ocorra tão somente em caso de alguma desconfiança ou com pessoas estranhas ao convívio escolar para não atrapalhar o fluxo de entrada e saída.
O disciplinamento da entrada no espaço escolar é decorrente do dever da escola de manter seu ecossistema funcionando com segurança em todos os seus setores. Sugere-se que somente alunos e colaboradores tenham acesso facilitado, embora monitorado. Pais e outros, somente com agendamento, e os terceirizados adentrando apenas fora do horário de expediente ou de pouca movimentação.
Sobre a revista de mochila de estudante apenas com a permissão de responsável do(a) menor entendemos não ser adequado ou legal. Inadequado, excetuando-se o caso de flagrante ameaça ou violência em andamento. Ilegal se não tiver decisão judicial autorizando, pois há aparente antinomia entre direitos fundamentais, devendo haver ponderação: direitos fundamentais à vida e a segurança, em detrimento dos direitos a intimidade e privacidade, uma vez que não há que se falar em intimidade e privacidade, sem a garantia do direito a vida. Sendo possível relativizar os direitos a intimidade e a privacidade, para que se prevaleça o direito a vida e a segurança das crianças e dos adolescentes.
Em relação ao parágrafo anterior, diz-se que no plano da Justiça, recentemente o SINEPE/MA – Sindicato das Instituições Particulares de Ensino (como terceiro interessado), juntamente com uma escola de São Luís/MA, conseguiu autorização judicial para a realização, em caráter temporário, de revista pessoal nos alunos, colaboradores e em todos aqueles que ingressarem no ambiente escolar, assim como em seus pertences, como bolsas e mochilas, independentemente da utilização de recursos tecnológico, com o objetivo de proteger a vida e a segurança das crianças e adolescentes nas escolas, bem como de seus colaboradores.
Muitas reflexões e ações estão em andamento mas, em meio a tantas controvérsias existe uma unanimidade inconteste: o melhor caminho é o da promoção da Cultura da Paz e do fortalecimento da saúde emocional dos aprendentes, famílias e colaboradores.
Uma resposta
Parabéns! Dr. Cláudio Santos, por trazer essa reflexão aos seus leitores.