Por Cristiane de Magalhães – poeta, professora de Língua Portuguesa.
Até metade do século XIX, as mulheres tinham educação restrita. As de classes mais altas adquiriam habilidades matrimoniais e alguns dotes como tocar piano e falar francês. As de classe mais baixa dificilmente chegavam à escola. Trabalhar fora era algo mais raro ainda. Mas, no final do século XIX, com a criação das Escolas Normais, destinadas à formação de professoras, algumas mulheres enxergaram possibilidade de ascensão educacional e profissional.
Naquele período, a profissão de professor, antes exclusivamente masculina, passou a ser uma profissão feminina. É preciso lembrar que no início do século XX, uma mulher trabalhar fora era algo muito raro, mas profissões que tinham esse estereótipo do cuidado eram socialmente aceitas.
Ensinar com mais amor e ter mais paciência com as crianças eram atributos que beiravam o “instinto materno”. Assim, foi se criando no imaginário da sociedade a ideia de que mulheres teriam uma vocação natural para o magistério, atrelando essa ideia a uma aura de sacerdócio. Além disso, mulheres não eram consideradas arrimo de família. Mais uma justificativa para os salários baixíssimos da época.
Por consequência desse desenrolar histórico, hoje temos a predominância de mulheres na educação básica. Segundo dados do Censo Escolar de 2020, divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), 96% dos professores da educação infantil são mulheres e no ensino fundamental são 82,5%. No ensino médio, a presença feminina é menor, mas ainda assim representam 62,5% do total de professores.
Assim sendo, qualquer atitude de congelamento de salário ou outro tipo de desvalorização atinge predominantemente às professoras. Hoje, somos sim arrimo de família e, por muitas vezes, damos conta da maior parte das despesas de nossas casas. Somos verdadeiras chefas de família, afinal.
Embora trabalhemos com amor, o que nos dá dignidade e qualidade de vida é salário justo. É com dinheiro que pagamos os brinquedos de nossos filhos e, muitas vezes, os remédios de nossos pais idosos. Além disso, não somos mais afetivas por sermos mulheres ou por termos vocação sacerdotal. Mas porque o afeto faz parte dos processos de ensino e aprendizagem.
De fato, ser professor exige muita dedicação, empenho e conhecimento técnico. Hoje, somos nós professoras, majoritariamente, que usamos nossas habilidades para formar cidadãos críticos, responsáveis e que conhecem seus direitos. Portanto, diante da predominância feminina na educação básica, os governos precisam reconhecer e valorizar nosso profissionalismo com condições adequadas de trabalho e remuneração justa.