Em textos anteriores evidenciamos que, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Brasil tem mais faculdades de Direito do que todos os países no mundo, juntos. E que o Ensino Jurídico pátrio ainda é deficiente em vários sentidos. Nesse contexto, qual a relação entre a Educação Básica e o ensino de Direito em escolas? Esse conteúdo curricular é necessário e/ou obrigatório na educação formal? Existem cases de sucesso em nosso Estado?
Nos primeiros semestres de qualquer curso de Direito nos deparamos com a afirmação de que vivemos em um Estado de Direito Positivo, em que todo direito é posto e imposto formalmente pelos poderes-função: Legislativo, Executivo e Judiciário. E, de modo mais perceptível, temos os processos legislativos estabelecendo nosso sistema educacional e normas infralegais emanadas do MEC e de Conselhos Estaduais e Municipais de Educação (decretos, resoluções, portarias, normas técnicas).
Para os profissionais do Direito Educacional, a conexão entre as escolas (de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio) e o Direito é algo inafastável, pois entendem que existe um universo legal, no qual estão inseridas (Constituição Federal, Medidas Provisórias, Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Estatuto da Criança e do Adolescente, Código de Defesa do Consumidor, Consolidação das Leis Trabalhistas, Código Penal, Código Civil, Leis Federais etc.) e que existem relações sociais específicas intituladas de juspedagógicas.
Será que é necessário ser um jurista ou acadêmico de Direito para ter noções de direitos e deveres que fazem parte de nosso cotidiano e de nossa convivência social dentro e fora das instituições de ensino? A resposta é não. Parafraseando o saudoso Paulo Nader, o Direito nasce do entrecruzamento de interesses em sociedade. O ambiente escolar é, por excelência, onde aprendemos a compatibilizar nossas vontades com as dos colegas, as dos professores e da administração; as regras estão presentes no dia a dia escolar.
Embora a família seja a nossa primeira instituição social, aquela a partir da qual todas as outras se desenvolvem, é nas escolas que aprimoramos nossa sociabilidade durante todo o período de formação de nossa personalidade. Assim, o conhecimento e a prática de regras de convivência institucionalizadas são um imperativo jurídico-educacional. Em outras palavras, o local e o momento inicial adequados para aprendermos sobre nossos direitos e deveres é nas escolas, durante a Educação Básica.
Com o professor Luis Hernandes aprendemos que a educação formal é obrigatória, pública, gratuita, universal, um direito social e dever do Estado e das famílias. É um direito público subjetivo, passível de judicialização por ser oponível erga omnes. E que os três objetivos da Educação são, o pleno desenvolvimento da pessoa, o preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho.
E por falar em cidadania (qualidade de ser cidadão, que tem direitos e deveres civis e políticos) na escola, é inerente a esta a elaboração das primeiras linhas para sua realização, não apenas por obviedade, mas também porque deve conter esse assunto em sua organização curricular.
O ensino de direitos e deveres durante o período escolar tem fundamento fático, como já exposto, e alicerce legal, também, dentre outros, no §9⁰, do art. 26 da LDB (Formação Geral Básica e Parte Diversificada dos Currículos), que determina a transmissão sistemática de conhecimentos sobre direitos humanos e a prevenção de todas as formas de violência contra a criança, o adolescente (ECA) e a mulher (Lei Maria da Penha – alteração feita pela Lei 14.164/21), como temas transversais.
Ainda nesse diapasão temos o arts. 27, I, e 32, II, §5⁰ da LDB (Formação Básica do Cidadão), a Lei 9.795/99 (Direito Ambiental), art. 76 do Código de Trânsito Brasileiro (Educação para o trânsito), art. 3⁰, IV, da Lei 14.533/23 (Educação Digital c/c Lei 13.709/18 – Lei Geral de Proteção de Dados).
Diversas iniciativas tentaram inserir o ensino do Direito nos componentes curriculares da Educação Básica. No entanto, uma delas desponta como uma prova real de que, com boa vontade, esforço coletivo e metodologia com efetividade, a docência jurídica é imprescindível para a implementação de uma cultura cidadã: “Programa Direito na Escola”.
Por meio do Instituto Direito na Escola, fundado pelo professor Lucas Andrade, em parcerias com várias instituições (incluindo a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB), professores de Direito (alguns voluntários e outros contratados) estão inserindo a dogmática jurídica como conteúdo no currículo do ensino fundamental e médio. E, com isso, estão assegurando aos educandos direitos de desenvolvimento pleno, cidadania e qualificação para o trabalho.
Diante disso, podemos concluir que: a) a formação cidadã começa nas escolas e não no Ensino Superior; b) o ensino formal de Direito nas escolas é essencial e há imposição legal nesse sentido; c) o programa “Direito na Escola” está demonstrando que ensinar direitos e obrigações no ensino básico é possível, e também é papel do educador.
2 respostas
Aplausos! Advogado Professor, Dr. Cláudio Santos , por mais uma vez trazer para o debate do Direito Educacional, uma temática de tamanha importância.
Através do ensino do Direito na Educação Básica, será possível promover uma formação com cidadania aos educandos.