Sou um cidadão do texto escrito. Toda a minha formação se deu a partir do contato com textos escritos. Por um longo tempo, foi a escrita a minha (quase) única forma de expressão. Lembro que, por exemplo, na faculdade de Jornalismo, o impresso era a grande vedete do curso, quase ninguém ligava para as outras plataformas – na época, apenas a fotografia, o rádio e a TV. Da web, nem se falava ainda, pois as aulas de informática eram feitas com o professor desenhando o computador no quadro… Antes disso, quando comecei a me interessar por leituras, os livros pouco tinham de figura; alguns, figura nenhuma. Tudo isso me fez ter uma relação quase umbilical com a palavra e a dar valor a ela por si própria, pelo que ela podia trazer de interessante, de sonoro, de único, de estranho até.
Claro que me adaptei. Não sou uma árvore. Aprendi com o tempo e as novas tecnologias a dar valor a fotos, vídeos, podcasts, cores etc e a compreender como eles potencializam o texto escrito. Mas ainda hoje a palavra é que baseia a grande maioria da minha comunicação. Um exemplo: uso poucas fotos no Facebook para ilustrar meus escritos, preferindo me comunicar com quem gosta deles com textos curtos, às vezes curtíssimos, às vezes nanos…uma palavra apenas, ou um sinal de pontuação.
Fico muito tempo pensando numa palavra, na força de expressividade que ela tem, ou nas muitas possibilidades de alterar a sua forma para que ganhe um novo/outro/diverso/contrário significado, sozinha ou combinada. Às vezes, consigo resultados bastante positivos. Outras vezes, não. É a vida de quem escreve – por prazer, por dinheiro, por escapismo, por psicanalismo. É o que diz João Cabral no poema Catar Feijão: “Catar feijão se limita com escrever:/ Jogam-se os grãos na água do alguidar e as palavras na folha de papel/E depois, joga-se fora o que boiar”.
Palavras nunca me passam incólumes. Fico prestando atenção à sua forma, à sua sonoridade, às combinações possíveis com outras para construir trocadilhos, ecos, progressões de sentido, paradoxos, por exemplo. É um trabalho detetivesco; é um grande jogo mental…
Na sociedade da imagem, a palavra ainda tem um grande peso. O ideal não são substituições, mas combinações perfeitas. A publicidade está aí mesmo para nos mostrar isso todos os dias, nas suas multiformas de aparecer e fazer parte do nosso cotidiano.
Palavras merecem carinho e cuidado.