As Festas Juninas, vindas da Europa com o catolicismo popular, que possuem origens pagãs de ciclos agrícolas, incorporadas pela Igreja Apostólica Romana, se tornaram, no Brasil, desde a Colônia, uma manifestação cultural de grande expressividade nacional e diversificada, o que hoje se transformam em eventos espetaculares, de alta performance e com palco montado e já fora ou se distanciando do chão popular, onde era tudo junto e misturado.
Em São Luiz do Maranhão, a capital maranhense, a Atena literária ou a Jamaica regueira, dependerá do gosto e origens culturais das pessoas, ou seus mesclados, o São João é um dos festivais-rituais pagãs mais salientes. Upaon-açú, antes indígena, depois colônia branca embasada na escravização de pessoas negras, fez da cultura ludovicense uma expressão de grande riqueza como o bumba-meu-boi, em especial.
No dia 29 de Junho de 2022, após dois anos sem o São João de São Luiz, nesse dia eu encontrei São Pedro andando pelas ruas do Reviver. A capela e a escadaria já recebia mais de dez mil devotos, brincantes de boi, mestres, toadores, que se amam ou se desgostam, mas tendo como referência o universo do boi-bumbá, que passam antes sua reverência na Casa das Minas.
Era dia ensolarado, São Pedro era negro, vestia roupas simples, estava um pouco embreagado da festa madrugueira. São Pedro se dirigiu a nós três, eu, filho e parceira, respondendo uma pergunta feita a outro passante, onde era o mercado mais próximo? São Pedro nos sequestrou a atenção, nos puxou para as ruas antigas e ancestrais, explicou os sótãos abaixo das casas como senzalas urbanas, com pequenas aberturas fechadas com grades de ferro no subsolo da casa grande. Lembrou do sofrimento da nossa raça negra ali nos porões, da má alimentação que viveu em outra vida escravizada, em farrapos humanos…
São Pedro nos deu uma aula naquele dia de São Pedro, a escadaria da capela ainda estava lotada, mas São Pedro estava ali, na nossa frente, negro, magro, sofrido e sábio. Ao nos deixar no mercado popular mais próximo, pela exposição de guia turístico que fez São Pedro, e pelo encantamento que nos proprocionou e nos embriagou de informações viscerais de outros tempos, contudo contemporâneas, São Pedro só nos pediu alimentos para o almoço seu e dos seus filhos. Claro, compramos mantimentos com um agradecimento sincero no peito e generoso no bolso, São Pedro tinha fome e era altamente simpático e educado.
Deixamos o estabelecimento pequeno e simples na rua do Giz, precisamente ao final da rua, e vimos São Pedro se despedir com um sorriso sincero e brilhante no rosto, tal como a estrela que brilha no meio da testa do boi.
Jamais imaginei encontrar São Pedro dessa forma, negro, mendicante e sábio. Não deixava nada a desejar a um monge mendicante do oriente.
Lembro do sentimento que esse encontro me gerou ao longo do dia, enebriado de emoção, informações renovadas e graça divina. Pela noite, São Pedro, em pleno dia 29 de Junho, logo o seu dia, eu, que nem sou religioso, ainda recebi São Pedro em sonho, conversamos e recebi instruções sobre o bem-viver e a vida simples que ele levava, feliz, felicidade que transbordava.
No meio da noite acordei assustado. Escutava os pandeirões e matracas e orquestras troando ao longe, na escadaria da capela de São Pedro. Ele deveria estar lá, pensei, testemunhando a devoção ludovicence e da baixada maranhense a Ele, o pescador ancestral, o padroeiro dos pescadores, de frente para a Baía de São Marcos, vizinha da Baía de São José.
São Pedro voltará no próximo ano, e espero reencontrá-lo e relatar a prática do que me ensinou em sonho, nesse tempo cíclico de reencontros. Só posso agradecer o encontro com São Pedro nas ruas do reviver, pois eu revivi algo que estava adormecido e que foi despertado por Ele. Viva São Pedro, ele continua vivo entre nós, não acima de nós, pois somos feitos da mesma natureza, somos criaturas da mesma fonte de vida, assim nos ensinou!