Escrito pelo britânico William Golding o Senhor das Moscas e lançado em 1954, o professor e veterano da Segunda Guerra Mundial, traz uma fábula cruel envolvendo um grupo de meninos que sobrevivem à queda de um avião e se veem no desafio de se virarem em uma ilha deserta sem a presença de adultos. Tudo, então, virou uma colônia de férias? NÃO. Apesar de serem crianças, o livro nos mostra que para voltarmos à selvageria, é necessário apenas uma oportunidade. Vou explicar.
Antes de continuar o texto, peço que você veja o clipe de Solar Power, da neozelandesa Lorde. Será que Solar Power da Lorde se encaixaria nessa ilha? De início, sim! Sol, areia, frutas, água fresca… a ilha tem o ambiente perfeito para que ali pudesse se desenvolver uma sociedade perfeita. É um Jardim do Éden. Ralph e Piggy são os primeiros personagens na narrativa e, com a ajuda de uma concha, conseguem convocar todos os sobreviventes para uma reunião. Ali é decidido um líder e estabelecida a divisão de tarefas. O objetivo principal é: serem resgatados.
Com o passar do tempo, as tarefas se tornam chatas e monótonas. O Solar Power de Lorde já começa a desmoronar. As crianças, entre 6 e 12 anos, querem saber apenas de brincar e se divertir. E é aí a coisa começa a ficar séria. Jack, o líder do grupo de meninos caçadores, começa a questionar as regras impostas e propõe um estilo de vida mais divertido: a caça. Os meninos então, começam a se dividir. É como no Gênesis: a serpente começa a ter voz no paraíso e aos poucos as coisas começam a mudar.
Existe também uma abordagem que nos leva à reflexão sobre o desprezo ao diferente. Piggy é personagem mais humilhado e subestimado dos meninos. Ele não é magro como os outros, tem asma e usa óculos. Aquela sociedade de um dia para noite firma os seus padrões. Piggy é inteligente, a voz da civilidade naquele ambiente inóspito. Mas isso importa para os meninos? Não. O garoto carrega o desprezo por simplesmente ser aquilo que é.
Quando os caçadores conseguem fazer a primeira caça bem sucedida, eles ficam simplesmente encantados com o poder que as lanças e a violência podem proporcionar. Isso certamente mudou tudo na ilha. O entendimento de que, assim como os porcos, aquela pequena sociedade poderia ser subjugada, começou a crescer na mente das crianças mais velhas. A partir dali, tudo teria preço de sangue. “‘O sangue espirrou longe’, disse Jack, rindo e estremecendo, ‘você deveria ter visto!'” (pag. 77)
As crianças mais novas começam a ter pesadelos. Agora, existe um monstro na ilha. Os mais velhos passam a trazer oferendas para ele e medo se instala. Aqui qualquer lembrança de civilização como eles conheciam é esquecida. Não quero dar spoilers, mas um dos meninos se impõe como chefe e começa a fazer tudo aquilo que considera o certo. Tudo regrado a tirania. O paraíso virou uma ditadura.
O homem é mal. Durante todo o livro fiquei pensando: “Meu Deus, mas são apenas crianças!” Para Golding, o autor, elas são tão capazes de atrocidades quanto os adultos. A máxima “O homem é bom por natureza. É a sociedade que o corrompe” de Jean-Jacques Rousseau neste livro cai por terra. À medida que a sociedade corrompe, ela é formada por pessoas corrompidas. O mal é inerente ao ser humano. Se colocados em determinadas condições, nós somos capazes de fazer qualquer coisa para obter aquilo que desejamos. Por fim, para entender mais sobre o tema, recomendo o livro A Assustadora História da Maldade, de Oliver Thomson.