segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

Assistência ou Assistencialismo?

Publicado em 17 de maio de 2024, às 11:07
Fonte: Cláudio Santos – Advogado, educador e comunicador.
Imagem: FreePik Premium

O povo brasileiro é mundialmente conhecido por suas habilidades comunicacionais, sua criatividade, sua irreverência, sua solidariedade e outros adjetivos relacionados a seu modo peculiar de lidar com alegrias e desapontamentos. Historicamente, vivencia uma busca/luta constante para humanizar suas instituições sociais e reivindicar direitos básicos para sua sobrevivência. Isso não lhe parece contraditório? De um lado seus habitantes demonstram perseverança e resiliência, e de outro, precisam requerer, reiteradamente, que sua dignidade seja respeitada pelo seu próprio Estado.

Em momentos de comoção nacional, a reação da sociedade brasileira no auxílio dos que estão em situação de vulnerabilidade é rápida, enérgica, emocionante (quase cinematográfica). Ajudar o próximo é uma regra inerente ao brasileiro. Mas até que ponto esse auxílio reativo e provisório é realístico, necessário e eficaz? Será que as medidas emergenciais que são tomadas individualmente, e de modo assistemático, produzem efeitos permanentes ou servem apenas para dar uma satisfação momentânea à nossa culpa, por não exigirmos do Estado o cumprimento de suas obrigações?

Em ano de eleições municipais para a escolha de nossos “representantes” do Executivo e do Legislativo, a Justiça Eleitoral a todo momento convoca os jovens a inscreverem-se para terem acesso ao título de eleitor, como se isso fosse um ato de cidadania. Não é! Preencher formulário e apresentar: documento oficial com foto, comprovante de residência, comprovante de pagamento de débito com a Justiça Eleitoral e comprovante de quitação do serviço militar não tornam o indivíduo cônscio das suas obrigações de cidadão, apenas majora o analfabetismo eleitoral, inegavelmente reinante em nosso país.

Mas o que isso tem a ver com assistência ou assistencialismo? Em um mundo ideal, cidadãos assistem e são assistidos, prioritariamente pelo Estado e, se for preciso, entre si (reciprocamente). E de modo algum tornam-se “reféns” (dependentes) de ações eleitoreiras ou voltadas para interesses de particulares, geradas pelo assistencialismo deliberado em momentos de catástrofes anunciadas. Reivindicar direitos não é suplicar por caridade!

É repugnante ver que no Brasil a “venda de indulgências” ainda se sobrepõe à cidadania. Milhares de pessoas dispostas a doar dinheiro, roupas, alimentos e algum tempo para auxiliar pessoas – temporariamente carentes – veiculadas à exaustão em todas as mídias sociais, mas nenhum “cidadão” para abrir mão de seus “penduricalhos” institucionais, verbas parlamentares, “rachadinhas”, licitações fraudulentas, lobby político ou sequer mobilizar-se, formalmente e coletivamente, para exigir dos Poderes Públicos a realização permanente do que fantasiosamente está expresso em nossa Carta Federativa: dignidade da pessoa humana.

Assistência e assistencialismo são conceitos similares, comumente relacionados e utilizados de forma intercambiável, porém distintos, sendo essencial entender suas diferenças. Isso é importante para garantir a eficácia das políticas públicas e ações sociais em proteção aos vulneráveis.

De acordo com Bastos (2024), a assistência social tem uma história de luta e conquista no Brasil, que remonta à década de 1940, quando era baseada na caridade e na solidariedade religiosa. Com a redemocratização do país na década de 1980, a assistência social passou a ser reconhecida como direito na Constituição de 1988, integrando a seguridade social junto com a saúde e a previdência. A partir daí, foram criados instrumentos legais e normativos para regulamentar e operacionalizar essa política, como a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), o Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), a Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e o Sistema Único de Assistência Social (SUAS).

A assistência refere-se à prestação de ajuda, suporte ou cuidado a indivíduos ou grupos que necessitam de auxílio. Pode incluir programas governamentais, organizações não governamentais, serviços sociais e comunitários, entre outros, que oferecem assistência para atender às necessidades básicas, como alimentação, moradia, saúde, educação e trabalho. A assistência deve ser temporária (é a regra), e seu objetivo principal é promover o bem-estar e a inclusão social das pessoas em situação de vulnerabilidade.

Ou seja, caracteriza-se por uma série de medidas e serviços temporários e de emergência concebidos para satisfazer as necessidades urgentes de indivíduos ou grupos em situações sociais, econômicas ou outras situações vulneráveis. Sua principal função é aliviar as privações e o sofrimento causados ​​por essas situações e facilitar a superação – temporária – de dificuldades.

O assistencialismo, por sua vez, é caracterizado por uma intervenção paternalista e verticalizada, geralmente realizada por órgãos públicos ou instituições privadas, que oferece benefícios e soluções prontas, sem levar em conta as causas estruturais da pobreza e da desigualdade social. Essa abordagem não promove a autonomia e o empoderamento dos indivíduos, mantendo a dependência e a passivação.

Em outras palavras, é uma abordagem caritativa para lidar com as necessidades sociais, na qual a ajuda é fornecida de cima para baixo, sem, necessariamente, incentivar a autonomia ou o empoderamento das pessoas assistidas. O assistencialismo pode ser definido como programas ou políticas que têm como objetivo apenas aliviar a pobreza imediata, sem abordar as causas subjacentes da desigualdade ou oferecer oportunidades reais de desenvolvimento pessoal e social. Em alguns casos, o assistencialismo pode gerar dependência e perpetuar ciclos de pobreza, em vez de incentivar a capacidade das pessoas de superar suas próprias dificuldades.

São práticas que têm origens, objetivos e consequências distintas. A assistência social é uma política pública que visa garantir o direito à proteção social a todos os cidadãos e cidadãs que dela precisam, de forma universal, gratuita e democrática. O assistencialismo, por outro lado, é uma forma de oferta de serviços por meio de uma doação, favor, boa vontade ou interesse de alguém, e não como um direito. O assistencialismo não tem uma base legal ou normativa, nem um plano ou avaliação. O assistencialismo não leva em consideração as necessidades e as demandas dos usuários, nem sua autonomia e cidadania. O assistencialismo é apenas uma forma de assistência tendenciosa, não contribuindo para a superação das desigualdades e das injustiças sociais.

Do que o brasileiro realmente precisa? Políticas públicas eficazes e solidariedade sincera ou espetacularização do infortúnio alheio, dependência institucional, subserviência às autoridades e total ausência de autonomias?

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