Meus estudos filosóficos da obra de Baruch de Espinosa são, nos últimos tempos, um achado magnífico do ponto de vista do meu autoconhecimento, do heteroconhecimento, conhecimento do outro, através da filosofia prática.
Espinosa, ou Spinosa, teve uma vida espinhosa que o levou à busca de compreender e viver a alegria como reafirmação da vida, perspectiva trágica clássica: em que pese o sofrimento inerente de viver, ainda assim, viver vale a pena! Dos espinhos Spinosa desenvolveu e alcançou um pensamento potente de encontrar alegria de viver mesmo diante das tristezas da vida. Influenciou Niestzche, Freud, Jung, Nise da Silveira, vários e até hoje.
Muito antes, as soluções dos filósofos Cínicos, que influenciaram os Estóicos, depois Sócrates, em paralelo com os mestres espirituais hindus, budistas, jainistas, todos são unânimes em dizer que uma saída para encontrar alegria na vida é encará-la de frente, assumir as sombras próprias e elevar o pensamento, o sentimento e o comportamento. Tarefa nada fácil pois que se posta como um desafio, um esforço e uma busca e bem colocada na obra de Spinosa.
Uma das concepções spinosianas é a de que Deus é a própria Natureza, Deus sive Natura, ou seja, só podemos compreender aquilo que chamamos de Deus não o observando diretamente, pois que se Ele se apresenta somente em visão aos grandes místicos, mas a nós comuns pelo observar da Natureza, a criação mais direta e expressão de um Deus misterioso, como o próprio Universo infinito.
Esse observar a Natureza que nos convida Spinosa o levou a compreender que devemos ver a mesma como composta de luzes e sombras, numinosa como dirá Jung. Se observarmnos a Natureza tanto o iluminado, o momento alegre, quanto o sombrio, o momento triste, que se alternam como ondas no nosso cotidiano, bem apontada pelos filósofos indianos, a equação de Spinosa é sermos ativos em criarmos, como criaturas- criativas, filhos do Criador, momentos mais felizes que mais tristes. Ou como dizem os hindus, budistas e janaistas: não gerarmos sofrimento, ou como dizia Ajahn Chao, famoso mestre budista tailandes, evitar o sofrimento meu e do outro pela meditação, silêncio e contemplação da natureza.
A equação de Spinoza é prática, portanto uma filosofia prática, em que nossa tarefa é gerarmos mais encontros felizes que encontros tristes, em que pese as partes sombrias inevitáveis da vida, devemos integrá-la (as sombras) e buscarmos mais a luz. Não uma luz que nos cegue, mas uma penumbra confortável que seja mais frequente que os sofrimentos vindos nas ondas de sombra. Pois assim é observado na Natureza, a expressão material mais observável de Deus, sendo sua criação e lei, o Dhrama oriental.
Quando observamos na natureza um filhote de um animal sendo devorado vivo por um predador, ou mesmo as atrocidades violentas entre humanos e as ocorrências dramáticas da natureza diante dos humanos, como terremotos, tsunamis e enchentes, estamos diante das sombras da mesma natureza. Mas quando nos distanciamos de nossa herança predadora para uma iluminação espiritual, a santidade, ou um bem-viver em harmonia com a natureza, a floresta, a sociedade, essa busca é a tarefa mais nobre na construção da nossa humanidade elevada. Daí sermos luzes e sombras, alegrias e tristezas, pois assim é a Natureza, por onde se expressa Deus-Mistério: Deus sive Natura!