De todos os livros da Bíblia, aquele do qual eu mais gosto é o de Jó. É a mais perfeita metáfora das muitas e muitas metáforas que o livro sagrado carrega, de tempos imemoriais. É o maior do maior dos heróis míticos que o Velho Testamento nos apresenta como exemplos a serem seguidos.
É uma história linda, comovente; de dor, ciúmes, invejas, vingança e agonias. Jó, servo do Altíssimo abençoado por riquezas e uma família perfeita, é escolhido pelo capiroto, na sua sempreterna luta contra o Boníssimo Criador, para testar a capacidade de o Homem ser fiel a quem lhe soprou a vida nas ventas. “Ele te dá graças porque é abençoado. Mas tira tudo o que ele tem e ele vai te amaldiçoar”, disse mais ou menos assim o sem-futuro, tentando o Alfa-Ômega na sua infinita capacidade de ser compassivo.
Pois o Todo-Bom permitiu que o coisa-ruim testasse a fidelidade de Jó, só o proibiu de lhe tirar a vida. E Jó sofreu. Sofreu como poucos heróis-personagens da odisseia bíblica sofrem. Sofreu mais que Prometeu acorrentado com o corvo lhe picando as vísceras.
Perdeu a riqueza, perdeu os parentes, perdeu a robustez, ficou com o corpo coberto de feridas, virou o irmão mais pobre de Lázaro, o padroeiro dos cachorros, aquele que comia as migalhas da mesa. Mas Jó, com todas essas perdas, com todo o sofrimento que o malditoso lhe afligiu, não renegou sua fé, não praguejou contra o Atemporal. “O Senhor me deu, o senhor me tirou. Bendito seja o nome do Senhor”, disse mais ou menos assim o paupérrimo Jó, enquanto raspava as curubas do corpo leproso com cacos de telha.
O infelicitoso perdeu a aposta com o Absoluto-Felicitoso e Jó teve reconstituído tudo o que perdera: suas terras, seus gados, seus filhos e filhas. Um a zero pro Fiat Lux.
É um livro repleto de amor. E com uma lição de persistência absolutamente imprescindível para esses tempos nossos, em que tudo parece ser geneticamente frágil, instável, imperdurável, inseguro. O livro de Jó, por tudo o que traz de lição de fortaleza, devia ser lido em cursos de administração, formação de guerrilha, negociação e de terapias de relacionamento. Jó transcende a religião.
Para esses tempos, o livro de Jó deveria ser um manual de instruções.