Embora prevenção de riscos à vida seja uma regra de ouro em qualquer atividade humana, no Brasil algumas medidas são tomadas somente depois de tragédias. A “Lei Lucas” evidencia que até mesmo no ambiente educacional a segurança nem sempre é priorizada. Esta Lei atingiu sua finalidade? O que as escolas podem e/ou devem fazer para que preservação da vida e ensino caminhem lado a lado?
Em um passeio escolar (responsabilidade da instituição de ensino) em 2017, o menino Lucas Begalli Zamora de Souza (de 10 anos de idade) engasgou-se com um pedaço de salsicha e faleceu alguns dias depois porque não recebeu de imediato os primeiros socorros (Manobra de Heimlich ou Desengasgo).
A partir desse fato (plenamente evitável) foi criada no âmbito federal a Lei nº 13.722/2018: que estabeleceu a obrigatoriedade de treinamento de professores e funcionários de estabelecimentos de ensino em noções básicas de primeiros socorros.
Antes de comentarmos a letra da Lei é imperioso asseverar que, em um país que massivamente faz publicidade sobre a importância da educação formal, ainda existe a necessidade de formalizar no plano legislativo o óbvio para instituições que lidam com vidas: treinamento em atendimento básico no início de uma emergência.
As relações juspedagógicas na educação básica e na recreação infantil visam proteger o bem jurídico maior nesses processos de ensino e aprendizagem: o educando. E, no caso das instituições privadas de ensino, a possibilidade de responsabilização por falta de cautela no trato com os estudantes é ainda maior porque se dá de modo objetivo (sem averiguação de culpa): basta haver nexo causal entre a ação/omissão do gestor e algum resultado negativo (dano).
Em nossas contribuições regulares em formações pedagógicas escolares, destacamos com veemência que a segurança nas escolas abrange todos os seus setores dentro e fora do ambiente educacional, a partir do momento em que as famílias lhes delegam seu bem mais precioso: a vida de seus filhos. Então não é crível que a comunidade escolar não esteja preparada para prevenir e agir diante de qualquer ameaça à integridade física e/ou psicológica de seus protegidos.
Reitere-se que a “Lei Lucas” torna obrigatória a capacitação em noções básicas de primeiros socorros de professores e funcionários de estabelecimentos de ensino públicos e privados de educação básica e de estabelecimentos de recreação infantil: para identificar e agir preventivamente em situações de emergência e urgência médicas, até que o suporte médico especializado, local ou remoto, se torne possível.
Anualmente deverá acontecer capacitação e/ou reciclagem de parte dos colaboradores (professores e funcionários), sem prejuízo de suas atividades ordinárias. A quantidade de participantes de cada estabelecimento educacional será definida em regulamento, levando-se em consideração o tamanho do corpo docente e demais empregados/servidores ou o fluxo de atendimento de crianças e adolescentes. E o conteúdo dos cursos de primeiros socorros básicos ministrados deverá ser condizente com a natureza e a faixa etária do público atendido nos estabelecimentos de ensino ou de recreação.
A responsabilidade pela realização dos cursos é dos respectivos sistemas ou redes de ensino (nas escolas públicas) e dos estabelecimentos privados. Em relação àqueles, o ensino dos primeiros socorros básicos será ministrado por entidades municipais ou estaduais especializadas em práticas de auxílio imediato e emergencial à população (da área da saúde, da defesa civil, bombeiros e socorristas, policiais, etc.). E para estes o conteúdo será trabalhado por profissionais habilitados (instrutores de primeiros socorros).
Os estabelecimentos de ensino ou de recreação das redes pública e particular devem cumprir, também, mais três determinações: a) dispor de kits de primeiros socorros, conforme orientação das entidades especializadas em atendimento emergencial à população; b) afixar em local visível a certificação que comprove a realização da capacitação de que trata essa Lei e o nome dos profissionais capacitados e c) estar integrados à rede de atenção de urgência e emergência de sua região e estabelecer fluxo de encaminhamento para uma unidade de saúde de referência.
A título de penalidades pelo não cumprimento das disposições da “Lei Lucas”, há três possibilidades: a) notificação de descumprimento da Lei (comunicação formal e oficial direcionada ao responsável legal pela instituição de ensino); b) multa (que pode ser aplicada em dobro em caso de reincidência) ou c) ocorrendo nova incidência (cassação do alvará de funcionamento ou da autorização concedida pelo órgão de educação, quando se tratar de creche ou estabelecimento particular de ensino ou de recreação, ou a responsabilização patrimonial do agente público, quando se tratar de creche ou estabelecimento público).
Porém, embora essa Lei esteja em vigência desde 2019, não encontramos registros no estado do Maranhão de que houve sua regulamentação pelo Poder Executivo (apenas recomendações do Ministério Público Estadual).
O comando está preconizado em seu texto: “Art. 6º O Poder Executivo definirá em regulamento os critérios para a implementação dos cursos de primeiros socorros previstos nesta Lei.”, ou seja, embora a observância dessa Lei seja obrigatória, a sua execução está prejudicada por falta de regulamentação no âmbito estadual (CEE/MA – Conselho Estadual de Educação do Maranhão e SEDUC – Secretaria de Educação do Maranhão) e também no sistema municipal (SEMED – Secretaria Municipal de Educação de Imperatriz/MA).
É oportuno ressaltar que, mesmo diante do “silêncio” do Executivo (regulamentação não encontrada), essa temática é de realização imediata: por ser indispensável e estar presente no dia a dia das escolas e instituições afins. E, com isso, os gestores-educadores têm sido proativos e adotado em seus protocolos institucionais de segurança “workshops” e palestras na preparação de equipes multiprofissionais/multidisciplinares para que os ambientes de aprendizado tenham Suporte Básico de Vida (SBV).
Conclui-se que a garantia de segurança no ambiente escolar independe de determinação do Estado, é inerente à própria atividade educacional e está sob a égide do princípio-mor do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente): o da proteção integral. Portanto, com ou sem regulamentação específica, o “mens legis” (espírito da lei) deve prevalecer para que a Educação seja realizada de modo eficaz.
2 respostas
Dr. Cláudio Santos, intelectual incomparável.
é muito importante que todos nois ficarmos atentos ,por isso é importante participar das palestras e aprender como agir em situações pois quando alguém sabe fica mais fácil