Vez por outra, me deparo com uma das seguintes frases, ditas ou escritas, em algum canto, para justificar tantos “erros” de Português e tantos problemas de redação que vemos, indistintamente: a) Os jovens de hoje não sabem escrever; b) Os jovens de hoje não escrevem mais; c) Os jovens de hoje não querem escrever mais nada; d) Os jovens de hoje não gostam de escrever; e) Na minha época, a gente fazia muito mais redação. Há outras, variantes, mas que seguem no mesmo tom. Nada mais falso que isso. É claro que os jovens de hoje escrevem. E, se duvidarmos, escrevem muito mais do que os jovens do passado.
Basta ver toda essa profusão de redes sociais – Facebook, Twitter, Instagram e assemelhados, de blogs, de salas de bate-papo em diversos temas e formatos, cuja base de comunicação ainda é a palavra escrita. E também a quantidade de redações que se fazem na escola – ah, sim, não esqueçamos que os jovens têm aulas de redação na escola. Então, essa meninada escreve muito. E escreve todo dia.
Então, o que é que há? Por que é que há tantos problemas com a apresentação que essa juventude faz da língua?
Na minha concepção, existem basicamente dois problemas. Em primeiro lugar, há uma dificuldade nesses meninos e meninas em se ater aos “registros” da língua; em entender que, assim como o guarda-roupas, a língua também exige, para cada ocasião, certa “vestimenta”. Haverá ocasiões em que ela será mais “relaxada”. Outras em que será mais “rígida”, entendendo essa rigidez como a aproximação com a norma culta, que é aquele conjunto de regras que se aprendem naquele livro chamado gramática – alguém se lembra dele? Trocando em miúdos: não se pode escrever um discurso de formatura, nem uma carta para o prefeito, nem um currículo, com a mesma “liberdade” linguística com que se posta um texto no Facebook, no Twitter, no Instagram, no WhatsApp. São registros distintos e os jovens precisam entender isso. E, entendendo isso, precisam atribuir o real valor às regras gramaticais, para aquelas comunicações em que o apego a elas é a base.
Em segundo lugar, há uma dificuldade na juventude em compreender o lugar dos gêneros textuais. Gêneros, relembrando, são aqueles conjuntos de textos que têm características semelhantes, que os definem. Por exemplo: toda bula de remédio é escrita da mesma forma, porque “bula de remédio” é um gênero de texto. Da mesma forma, todo e-mail tem iguais características. Da mesmíssima forma, toda “redação” para o Enem terá características semelhantes. Então, quando se diz que os jovens não escrevem, na imensa maioria dos casos se está referindo ao fato de que eles não escrevem gêneros “escolares”, basicamente aqueles pedidos nos exames tipo Enem e nos concursos. Assim como devem dominar os registros, os jovens também devem dominar os gêneros. E cabe aos professores de redação treinar com eles o gênero “redação”. Mas não só ele. Até porque, depois que passar o Enem, dificilmente eles utilizarão esse texto tipo “redação” para outra coisa…
Então, ao invés de ficarmos vociferando que os jovens “não escrevem”, devemos é estimulá-los a escrever nos diversos gêneros, com os mais distintos registros. E aí teremos jovens com competência para enfrentar qualquer tipo de redação.
Uma resposta
Concordo com você mestre Fábio. Mas tenho uma observação a fazer: a falha nestes jovens de escrever sem base em gêneros ou melhor, definir a sua escrita para os textos adequados. É simplesmente a falta da leitura. A leitura de bons livros. A leitura que fazem é de extrema precariedade. Fazem uma leitura de redes sociais, a leitura como falam, ou seja na linguagem coloquial. Parabéns pelo seu texto cronista.