domingo, 1 de dezembro de 2024

Confusão no cartório*

Publicado em 20 de março de 2021, às 8:28
Imagem: Free Pik

A confusão foi grande demais na semana passada num determinado cartório do registro civil de uma cidade de 15 mil habitantes, do interior do Brasil. Pai novo, um cortador de cana havia chegado na cidade para registrar o filho. Precisava resolver logo a situação e voltar rapidinho para a serra, onde trabalhava e morava havia alguns meses. A pandemia do coronavírus, até aquele dia, não tinha mudado em nada a rotina dele.  Continuava a trabalhar duro do mesmo jeito.  A folga recebida do – exigente – patrão era apenas para registrar o garoto e nada mais.

Longe do serviço e do olhar do chefe, embalado pelo nascimento filho, decidiu que não custaria nada tomar uma Pitu com caju, antes de ir ao cartório. Seu primogênito havia nascido e uma comemoração era preciso.   Só que o boia fria, como já era de se esperar, não ficou apenas nisso. Engatou uma atrás da outra e quase que perdia a hora do cartório, por causa disso.

E foi assim, cambaleante, cego pela cachaça, que o cortador de cana chegou ao compromisso. A confusão teve início ali. É que, apenas naquele momento, percebeu que não sabia que nome pôr no filho. Nem a mulher tinha lhe dado qualquer sugestão.

– Com qual nome o senhor vai registrar seu garoto? – Perguntou o oficial do registro.

O cortador de cana meio perdido pensou por alguns instantes,  e no alto da sua embriaguez,  levantou a cabeça e numa voz pastosa, para todo mundo ouvir, gritou ao oficial:

– Meu filho vai se chamar Alcoolingelson Ferreira da Silva. Na verdade, fiquei aqui na dúvida entre esse nome e  Lockindowson,  mas  Alcoolingelson  acho mais bonito. Pode escrever bem aí – vociferou o bebum.

O oficial do registro, todo educado, retrucou:

-Infelizmente nenhum desses nomes será possível.  Imagine que no futuro qualquer um desses nomes vai prejudicar muito a vida de seu garoto.

Ao ouvir a negativa, o cortador de cana zangou na mesma da hora, e foi logo dizendo:

-O quê, papai? O filho é meu!  Ponho nele o nome que eu quiser. Escreve do jeito que estou te dizendo, Alcoolingelson, e pronto!

– Senhor, já disse que com esses nomes não será possível registrar o menino- devolveu o cartorário, já irritado com a situação.

Naquele instante, a confusão já era grande. Num descuido o cortador de cana já estava do outro lado do balcão, valente como nunca estivera, e derrubando uma pilha de processos que estava numa mesa.

Pense na confusão!  

-Alcooingelson vai ser o nome do meu filho, nem que eu tenha que sangrar gente aqui! – Ameaçou o cortador de cana, que insinuou puxar algo da cintura.

 Àquela altura a segurança do prédio já tinha sido acionada. Dois parrudos chegaram para imobilizar o exaltado boia fria, que continuava possesso por conta da negativa do pessoal do cartório.

Foi luta. Já com a metade da cana suada, ao perceber que se continuasse com aquele modo ia acabar dormindo na cadeia, e que a prisão poderia custar seu emprego, o cortador de cana freou e gritou:

-Tá bom, tá bom, já tô mais calmo!  Pensei aqui num outro nome para meu filho para resolver essa confusão. Não precisa me levar para a delegacia, não.

Mais tranquilo,  já livre do  “mata leão” dos seguranças,  de volta ao balcão do cartório, o boia fria,  agora falando mais baixo, mas ainda visivelmente embriagado, chamou o homem do cartório e,  sob o olhar dos curiosos que ali se aglomeravam,   anunciou:

– Pronto moço, já estou com um outro nome para meu menino.

– Ah, bom! Finalmente. E qual é esse nome? – Perguntou o cara do cartório.

-Vamos fazer assim: pra não ter mais confusão. Tira o álcool e deixa só Gelson. Tá certo, assim?

O conflito acabou e o cortador de cana voltou para casa com o registro de nascimento do filho. Nada de Lockidowson ou Alcooingelson, mas Gelson Ferreira da Silva.

*Baseado em fatos reais.

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